Descontrole da pandemia e segunda onda de Covid abalam confiança e derrubam previsões de recuperação | Economia


O Brasil está há mais de 20 dias com média móvel de mortes pela Covid-19 acima de 1 mil por dia. Agravada pelas reuniões de fim de ano, a segunda onda de contágios se intensifica e, além de ter feito a contagem de vítimas passar de 236 mil, põe em risco o que houve de melhora na economia do país desde o primeiro pico, entre março e abril.

Para economistas ouvidos pelo G1, a pandemia fora de controle empurra indefinidamente o retorno à normalidade e faz com que o impasse não se resolva.

São 5 tópicos principais:

  • Subida de contágios pelo coronavírus
  • Término de programas de auxílio econômico no Brasil
  • Atrasos na vacinação contra a Covid-19 em todo o mundo
  • Diminuição da confiança do consumidor e do empresário
  • Falta de previsibilidade sobre a contenção do déficit das contas públicas

De forma simplificada, o círculo vicioso acontece da seguinte forma: o fim de programas sociais sem substitutos resulta em queda de renda e maior procura por empregos. Com uma disputa mais acirrada por trabalho e dificuldade de acesso à renda, aumenta a desconfiança de quem, mesmo empregado, gostaria de consumir mais.

Sem vacinação robusta para controle da pandemia, segue se arrastando a percepção de que tudo pode voltar a piorar. Por fim, a incerteza de quando esse consumo retornará aos patamares normais faz empresários atrasarem os investimentos — dentre eles, a criação de vagas.

Os economistas procuram entender, agora, se a quebra do ciclo deve vir de nova rodada de estímulos financeiros por parte do governo.

Auxílio Emergencial vai voltar?

Flávia sobre auxílio emergencial:
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3 min Flávia sobre auxílio emergencial: ‘Governo que não sabe operar área social e que opera mal a área econômica e política’

Flávia sobre auxílio emergencial: ‘Governo que não sabe operar área social e que opera mal a área econômica e política’

Comentarista da GloboNews repercute impasse do governo federal sobre o auxílio emergencial durante a pandemia da Covid-19.

Oficialmente, o Auxílio Emergencial foi encerrado na virada do ano. A última parcela foi depositada em 29 de dezembro e, desde então, as classes sociais mais vulneráveis retornaram ao Bolsa Família ou tiveram ganhos interrompidos.

Além do Auxílio, terminou também outro importante programa de ajuda na pandemia, o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm). Neste caso, a retirada afeta principalmente a população de renda média.

O BEm permitia aos empresários diminuir os custos da folha de pagamento por meio da redução da jornada ou suspensão do contrato de trabalho formal – a carteira assinada. Como forma de compensação, o governo pagou um auxílio para complementar os ganhos do trabalhador enquanto o afastamento durasse. Foram mais de 20 milhões de acordos fechados.

Com esse cenário de retirada dos programas sociais e redução do faturamento médio do brasileiro, a consultoria A.C. Pastore revisou para baixo sua projeção do PIB para 2021: a estimativa era de 4,1% e passou a ser de 3%.

“Com a pandemia piorando, em tendência crescente, não se encerra a incerteza de resposta do mercado de trabalho. Quem tinha o auxílio não conseguiu substituir a renda e quem tem emprego fica com medo de perdê-lo. Tudo retrai o consumo”, diz Paula Magalhães, economista-chefe da A.C. Pastore.

Nesta sexta, o Banco Central informou que o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) da instituição, considerado uma “prévia” do resultado do PIB, aponta que a economia brasileira encolheu, em 2020, 4,05%.

Também pautada no ritmo das vacinas e no fim dos auxílios, a MB Associados previu o aumento da queda prevista para o primeiro trimestre do ano, de -0,1% para -0,8%. A consultoria também não descarta uma nova queda no segundo trimestre de 0,3%.

“O mercado de trabalho deverá se ressentir, com a taxa de desemprego subindo aos 15% nos próximos meses, por motivos sazonais, mas também pela necessidade de as pessoas começarem a procurar emprego com a saída do auxílio”, diz o relatório do economista-chefe Sérgio Vale.

Mesmo depois de negar a possibilidade de prorrogar o Auxílio Emergencial, o presidente Jair Bolsonaro indicou na quinta-feira (11) que o programa deve retornar por três ou quatro meses. Seria em um modelo reduzido em valor mensal e em número de beneficiários.

Paulo Guedes: ‘Temos que pagar pelas nossas guerras e não empurrar para o futuro’
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O governo lida com a pressão para a retomada do pagamento do auxílio emergencial. O ministro da Economia deu a declaração após se reunir com parlamentares da Comissão Mista de Orçamento.

A equipe econômica do ministro Paulo Guedes se preocupa com o endividamento do país — cuja dívida bruta chegou perto dos 90% do PIB no ano passado — e em manter o teto de gastos, emenda constitucional que atrela o aumento de despesas à inflação.

Para permitir o gasto intenso durante a pandemia, foi decretado estado de calamidade pública, que liberava despesas em caráter emergencial e também se encerrou no fim de 2020.

A corrente majoritária dos economistas atribui à regra do teto o ambiente para manutenção de juros baixos, que segura a escalada da dívida pública e permitiria uma saída mais rápida da crise por meio de investimentos empresariais. O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse, inclusive, que um retorno do auxílio sem “contraparte” resultaria em alta da taxa Selic.

Mas há uma corrente crescente de economistas que discorda, pois defende que o apoio necessário durante a crise ainda dependeria de manobras fiscais e monetárias por parte do governo.

“Acaba surgindo um ‘medo’ de acabar o teto de gastos porque, no momento, a discussão é gastar sem outra política fiscal para colocar no lugar. Se é o caso de mudar o teto ou inserir auxílios, precisaria explicar o que vai fazer para ter os gastos sob controle e ancorar as expectativas em um modelo fiscal”, diz Paula Magalhães.

Na hipótese de nenhum programa social ser criado, e nem que o Auxílio Emergencial fosse prorrogado, uma fatia de 10% a 15% da população brasileira cairia para a linha da pobreza extrema neste ano. Outros 30% a 35% iriam para a linha da pobreza. Os cálculos são do economista Daniel Duque, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

Uma pesquisa já apontou que só em janeiro, o fim do auxílio empurrou 2 milhões de brasileiros para a pobreza.

Especial: fim do auxílio emergencial pode deixar 63 milhões abaixo da linha da pobreza
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11 min Especial: fim do auxílio emergencial pode deixar 63 milhões abaixo da linha da pobreza

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Fim do pagamento esquentou o debate sobre uma possível extensão do benefício. Economistas se preocupam com o impacto fiscal, mas há diferentes propostas sobre como custear o alívio aos mais necessitados. Veja na reportagem.

Ainda que se discuta a trajetória de gastos públicos, o abalo dos índices de confiança da Fundação Getulio Vargas (FGV) nos últimos meses está mais relacionado ao avanço da Covid-19.

Exceto a confiança da Indústria, os outros três índices principais passaram a apontar para baixo no último trimestre de 2020, assim que as mortes pela doença voltaram a subir. Em janeiro, até mesmo a Indústria trocou o sinal.

“Os indicadores de confiança são divididos em situação atual e expectativa futura. No quarto trimestre, houve piora mais forte da expectativa, mas, no começo de 2021, o sentimento de pessimismo passou afetar também o presente”, afirma Rodolpho Tobler, economista do Ibre/FGV.

Segundo Tobler, os atrasos na vacinação impactaram menos as expectativas do que a força da segunda onda da Covid-19. Isso porque era esperado que os efeitos de uma vacinação em massa seriam percebidos de forma mais clara no segundo semestre, mas não se esperava o retorno de dias em fase vermelha em São Paulo e lockdown em Belo Horizonte, dentre outros efeitos da pandemia.

“Há um medo claro de perda de demanda. O clima negativo talvez fosse menor se houvesse mais clareza de quais os planos do governo nesse buraco entre piora da pandemia e espera até o resultado das vacinas”, diz.

O Itaú Unibanco possui um medidor próprio de atividade econômica. Ele rastreia determinados setores da economia para saber se há aquecimento da economia no período. Depois de uma crescente feroz com o afrouxamento do isolamento social, o índice passou a oscilar desde setembro.

A equipe do banco, contudo, entende o freio no crescimento como natural, pois se tratava de um comparativo com contração muito intensa. Mas, assim como os demais economistas consultados, as atenções estão no aumento de restrições com a piora do vírus e a retirada dos auxílios.

“Teoricamente pode gerar contração da economia, mas os dados de janeiro mostram estabilidade em vez de queda. Estar estável com ventos contra é, de certa forma, positivo”, diz Luka Barbosa, economista do Itaú Unibanco.

Barbosa diz ainda que outros setores que não são monitorados pelo indicador diário, como agricultura, indústria extrativa, intermediação financeira, setor imobiliário e de construção cresceram bem no último trimestre de 2020, e trazem uma recuperação do ponto de vista de PIB.

O banco, inclusive, acredita que as exportações terão um papel importante mais uma vez em 2021, visto que a China, principal parceiro comercial do Brasil, se recuperou bem da crise e está em fase de compensar a demanda reprimida pela pandemia. Os Estados Unidos, segundo lugar na lista, possuem planos ambiciosos de vacinação que devem se resolver ainda neste ano.

“Tem muitos estímulos monetários e fiscais em ação, que estão puxando a demanda por commodities. Isso ajuda o Brasil e deve continuar como vetor positivo de crescimento”, afirma o economista.

A vacinação em massa no Brasil, contudo, seria o impulso necessário para que volte a patamares satisfatórios o setor de serviços, o mais afetado pela necessidade de distanciamento e o mais importante para geração de empregos. O banco estima que, mesmo sem o término da campanha de vacinação, o segundo semestre terá um patamar de vacinação suficiente para que as atividades do setor saiam da lona.

Bolsa estagnada depois de recordes

Depois de chegar a 125 mil pontos na primeira semana de 2021, a bolsa passou a andar de lado. Como de costume, investidores estão de olho na agenda fiscal do país e as perspectivas de ajuste de contas.

Apesar de as eleições para o comando do legislativo terem terminado com resultado positivo para o governo Jair Bolsonaro, o arranque de casos de coronavírus desviou as atenções do mercado financeiro da agenda de reformas estruturais para o financiamento da nova rodada de ajuda à economia.

“Não é mais questão de ‘se vai ter’, mas como vai ser implementado o novo Auxílio Emergencial”, diz Fabio Akira, economista-chefe da BlueLine Asset Management.

Para o analista, três cenários estão postos à mesa. No mais positivo, o novo auxílio seria instaurado paralelamente à tramitação de alguma medida de sustentabilidade fiscal. Em suma, um corte de gasto para compensar a nova despesa. No cenário intermediário, o Auxílio seria compensado com algum tributo temporário. No pior, seria incorporado sem contrapartidas.

“O mercado nem está com muita expectativa sobre a reforma tributária, a administrativa e a desvinculação de gastos. Acabou virando secundário. É uma pena, pois poderia trazer oportunidade de ganhos maiores ao país”, diz.

O dólar também se tornou indicativo claro do impacto dos ruídos da agenda econômica. Como lembra o economista, a moeda americana passou por um momento de fraqueza internacional desde meados do ano passado, graças à expansão fiscal americana.

O Brasil surfou nessa onda em poucos momentos, quando a incerteza doméstiva estava sob controle, mas acabou mais penalizado que a média dos países emergentes. Em 2020, o dólar teve valorização de 29% sobre o real. Em 2021, acumula mais 3,5% de alta.

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Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira, se reuniram com presidente da comissão que discute o tema e com o relator da proposta.

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Fonte: G1