Como fica o uso do telefone pessoal no home office? Entenda | Concursos e Emprego


A pandemia levou milhares de empregados a trabalhar em casa. E, com isso, muitos acabaram tendo que se adaptar rapidamente às novas condições de trabalho. Entre elas, o uso de equipamentos, que antes eram disponibilizados pelas empresas dentro dos escritórios, e que acabou ficando sob a responsabilidade dos próprios funcionários.

Mas como fica a questão do uso do telefone? Os empregadores devem fornecer o equipamento a todos os que estão em home office? E se o empregado tiver que usar seu celular pessoal? Como ficam os custos e as horas trabalhadas fora da jornada?

Veja abaixo tira dúvidas sobre o assunto com Ruslan Stuchi, sócio do Stuchi Advogados, Ricardo Calcini, Professor de Direito do Trabalho da Pós-Graduação da FMU e Lariane Del Vecchio, sócia do BDB Advogados.

A empresa tem obrigação de fornecer celular corporativo para seus funcionários que trabalham em casa?

Ruslan Stuchi: se há necessidade de uso do celular e especificamente das ferramentas de mensagens para comunicação e desempenho das atividades do empregado, compete à empresa fornecer o equipamento e arcar com as despesas do serviço da operadora de telefonia móvel.

Ricardo Calcini: não é obrigatório, a não ser se houver previsão em regulamento da empresa. Embora hoje o celular seja visto como uma ferramenta de trabalho, basta que a empresa restitua o valor da cobrança das ligações.

Lariane Del Vecchio: se o celular fizer parte da estrutura necessária para o trabalho, a empresa deve fornecer o equipamento.

Usar o celular pessoal em home office é permitido?

Ruslan Stuchi: até o momento, não existe lei específica que regule o uso do celular particular a serviço da empresa. Existem apenas entendimentos jurisprudenciais sobre o tema. Assim, a empresa não pode obrigar o empregado a usar o seu patrimônio em prol dos serviços dela própria.

Ricardo Calcini: sim, isso sempre existiu no sistema do trabalho presencial. Inclusive há casos em que os celulares possuem dois chips, sendo a linha corporativa, neste caso, custeada pela empresa.

A empresa tem que pagar pelo custo do uso do aparelho pessoal? E se não pagar? O funcionário pode depois acionar na Justiça esses gastos?

Ruslan Stuchi: cabem ao empregador os custos dos equipamentos e dos serviços atrelados a eles, comparando-se ao fornecimento de uniforme ou de uma ferramenta de trabalho. Caso o empregado utilize o próprio celular para realizar atividades relacionadas ao trabalho, compete ao empregador arcar com os custos. Se isso não acontecer, o caso pode ser judicializado.

Ricardo Calcini: em regra, não, se o funcionário também usa o aparelho para fins pessoais. A exigência da cobrança ocorrerá quando o trabalhador não detiver o seu próprio aparelho e, em razão de sua atividade laborativa, tiver que usar o celular como instrumento de trabalho.

Lariane Del Vecchio: se a empresa necessita do celular como estrutura para o trabalho e não tem para comprar, ela pode fazer acordo escrito de reembolso das despesas com o aparelho.

Posso me recusar a usar meu telefone pessoal em caso de a empresa não fornecer um celular e usar como alternativa e-mails e plataformas de encontro virtuais?

Ruslan Stuchi: a empresa não pode exigir que o empregado utilize seus próprios instrumentos para o desempenho de suas atividades. Todos os custos de realização do trabalho pertencem unicamente ao empregador e não podem ser repassados ao funcionário.

Ricardo Calcini: em regra, sim, porque o telefone pessoal está servindo como instrumento de trabalho. Mas, na medida em que são usadas alternativas pela empresa, como a adoção de e-mails e plataformas de encontros virtuais, o uso do celular se torna desnecessário.

Lariane Del Vecchio: o funcionário não pode ser obrigado a usar o patrimônio particular em prol da empresa, podendo se utilizar dos instrumentos disponibilizados pela empresa para comunicação.

O funcionário que recebe mensagens ou ligações fora do horário de trabalho pode considerar esse período como trabalhado?

Ruslan Stuchi: sim, o funcionário que recebe mensagens ou ligações fora do horário de trabalho pode considerar esse período como trabalhado, podendo assim optar por responder apenas durante seu horário de jornada. Caso haja a imposição da resposta fora do horário de trabalho, compete à empresa pagar as horas extras realizadas.

Ricardo Calcini: a simples ligação ou recebimento de mensagens fora do horário de trabalho, por si só, não constituem tempo à disposição da empresa, não podendo o reclamante pedir o pagamento de horas extras. Não há efetivo trabalho exercido, salvo se forem reuniões virtuais, por exemplo. Embora não configure período de trabalho, tais ligações ou mensagens podem, em tese, violar o direito de desconexão do trabalhador e, em casos extremos, justificar o pagamento de danos morais.

Lariane Del Vecchio: como regra geral, o home office não implica em controle de jornada. A exceção é quando existe previsão expressa e em sentido contrário por meio de acordo ou convenção coletiva. Em caso de os trabalhadores terem sua jornada de trabalho efetivamente controlada, poderão ter direito a horas extras.

O uso frequente do celular pessoal pode fazer com que o empregado seja abordado não só pela empresa em que trabalha, mas por clientes e outras pessoas envolvidas no seu trabalho fora do horário da jornada? Isso configura hora extra?

Ruslan Stuchi: o funcionário pode receber hora extra em qualquer situação que exija o desempenho da atividade laboral fora da jornada normal de serviço, tanto atividade desenvolvida por seus superiores como pelos clientes.

Ricardo Calcini: se o funcionário está tratando de questões pessoais através do uso de seu celular pessoal, a mera abordagem pela empresa ou clientes e outras pessoas envolvidas no seu trabalho, mesmo que fora do horário da jornada, não configura hora extra. Se for por questão de trabalho, aí, sim, pode justificar hora extra.

Lariane Del Vecchio: a MP 1.046, que disciplina o teletrabalho, deixa claro que o tempo de uso de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessária, assim como de softwares, de ferramentas digitais ou de aplicações de internet utilizados para o teletrabalho fora da jornada de trabalho normal do empregado, não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou em acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Se a empresa não pagar o período trabalhado fora da jornada, o funcionário pode pedir essas horas na Justiça? Como ele faz para comprovar em uma eventual ação?

Ruslan Stuchi: sim, se a empresa não pagar o período trabalhado fora da jornada, o funcionário pode pedir essas horas na Justiça e deve comprovar através das mensagens, e-mails e ligações, para que seja verificado o tempo estimado em que trabalhou fora de sua jornada.

Ricardo Calcini: o período laborado fora da jornada é, por força de lei, considerado como hora extraordinária. Assim, o funcionário tem direito a pleitear as horas extras na Justiça do Trabalho. Sobre a prova, basta que se faça a comprovação da gravação das conversas, reuniões ou troca de mensagens, em que ficou configurado o efetivo exercício do trabalho pelo funcionário.

Lariane Del Vecchio: se a empresa de fato exercer controle de jornada e se o funcionário comprovar que foram ultrapassadas as horas estipuladas em contrato, cabe o pagamento de horas extras.



Fonte: G1