Como a aparência jovem pode afetar sua carreira | Concursos e Emprego


Era 4 de abril de 1911: o primeiro dia de trabalho de William F Murray. Ele havia prestado juramento no 62º Congresso dos Estados Unidos e estava pronto para começar uma ilustre carreira na política.

Só havia um problema. Murray tinha 29 anos, o que fazia dele o deputado mais jovem da época.

Ele tinha feições incomumente juvenis, e repartia o cabelo de lado — como se estivesse posando para uma foto de escola.

Ao lado de seus colegas grisalhos e barrigudos, seria justo dizer que ele realmente destoava.

Naquele mesmo dia, o presidente da Casa deu uma ordem para ele buscar um livro, após confundi-lo com um dos chamados House Pages — função geralmente desempenhada por alunos do ensino médio.

“Tudo bem, Bill”, disse Murray.

“Mas da próxima vez, gentilmente, dirija-se a mim como ‘o membro de Massachusetts’.”

Em quase todas as outras áreas da vida, parecer jovem é algo altamente cobiçado.

Em 2022, estima-se que a indústria antienvelhecimento vai atingir cerca de US$ 260 bilhões, com alguns indivíduos gastando mais em rejuvenescimento facial por mês do que com a parcela do financiamento da casa própria.

Mas, no escritório, a história é diferente. Atualmente, não há dados sobre exatamente quantas pessoas são afetadas negativamente por sua aparência jovem a cada ano — mas a internet está repleta de histórias angustiantes sobre constrangimentos e mal-entendidos.

Tem o caso da professora que foi chamada atenção por estar na sala dos professores sem permissão, e ainda precisou mostrar a identidade; o funcionário de cervejaria confundido com uma “garotinha” por um cliente; e os diversos médicos que escutam diariamente de pacientes espantados: “Você parece tão jovem!”.

Na verdade, há cada vez mais evidências de que parecer mais jovem do que a idade que você tem, não é apenas inconveniente — pode ter um impacto radical na forma como sua competência é vista, e até mesmo determinar o tipo de trabalho que você faz.

Há várias razões subjacentes pelas quais as pessoas acham que aparentam ser mais jovens do que realmente são: você pode ser mignon, ter estatura baixa ou usar roupas da moda, por exemplo.

Mas o motivo mais estudado é ter carinha de bebê. O “efeito de supergeneralização da carinha de bebê”, descoberto pela primeira vez na década de 1980, se deve ao fato de que possuir características faciais infantis leva as pessoas a supor que você tem traços de personalidade correspondentes.

“(A carinha de bebê) é realmente uma constelação geral de características”, diz Leslie Zebrowitz, professora emérita de relações sociais da Brandeis University, nos Estados Unidos, uma das responsáveis pela descoberta do fenômeno.

Ela explica que isso costuma prever um rosto liso e redondo, maxilar pequeno, nariz delicado e olhos grandes, enquanto indivíduos de aparência mais madura geralmente têm olhos menores, maçãs do rosto mais angulares, narizes maiores e o cenho mais acentuado.

É consagrado que as pessoas com carinha de bebê parecem jovens porque, literalmente, elas lembram bebês.

Estranhamente, o efeito se aplica não importando quantos anos você realmente tenha — ou se você tem a pele de pêssego de uma modelo de anúncio de hidratante ou o rosto um pouco mais castigado de um amante do sol de longa data.

A estrutura facial das pessoas com carinha de bebê faz com que elas geralmente pareçam jovens em relação a outras pessoas da mesma faixa etária, o que significa que as associações atreladas a essa aparência ainda podem ter um impacto tanto na meia-idade quanto mais tarde na vida.

Há algumas vantagens em lembrar um bebê fofo — acredita-se que o efeito carinha de bebê suscite os mesmos comportamentos que nos ajudam a proteger esses membros vulneráveis ​​da sociedade, então você é automaticamente considerado afetuoso, confiável e gentil.

Como era de se esperar, as carinhas de bebê são onipresentes em desenhos animados infantis, personagens em anúncios e mascotes esportivos.

Pessoas com carinha de bebê também têm mais chance de serem encontradas em determinados empregos. Em um estudo, elas foram mais propensas a serem consideradas a ocupar um cargo de professor em uma creche que exigia explicitamente que os candidatos fossem calorosos e submissos.

Pessoas com carinha de bebê têm uma vida mais fácil em vários aspectos: costumam ser consideradas mais atraentes mesmo em diferentes populações, como os Aché, caçadores-coletores do Paraguai, e estudantes universitários da Rússia.

Mas também se espera que não tenham certas características que podem ser essenciais para subir na carreira ou simplesmente para atuar em algumas profissões.

Por exemplo, a mesma pesquisa que identificou o viés a favor de candidatos com carinha de bebê para ocupar cargos de professor, também descobriu que pessoas de aparência madura geralmente eram preferidas para o posto de diretor, que exigia liderança e capacidade de tomar decisões difíceis.

Talvez como resultado, indivíduos que parecem jovens para a idade tendem a ter empregos de status inferior, que carecem desse tipo de autoridade.

Isso pode ser porque pessoas com rosto de bebê são vistas como tendo menos “controle pessoal” — definido como competência, domínio ou capacidade de realizar seus objetivos — do que outras no início ou no meio da idade adulta, assim como indivíduos que são considerados pouco atraentes ou com sobrepeso.

Não apenas as pessoas que parecem mais velhas têm mais chance de serem cogitadas para desempenhar funções gerenciais de status elevado, como também são consideradas mais adequadas para empregos que exigem um nível mais alto de escolaridade.

“Portanto, pessoas de rosto maduro têm resultados semelhantes no mercado de trabalho àquelas com alto desempenho”, diz Zebrowitz.

Em um estudo, homens considerados com carinha de bebê se mostraram mais propensos a obter empregos como cuidadores de crianças, professores do ensino fundamental, assistentes de professores e membros do clero, e menos probabilidade de serem juízes, motoristas de caminhão, policiais e a ocvupar cargos de chefia em geral.

No caso das mulheres de aparência jovem, as carreiras mais comuns foram semelhantes: professoras do ensino fundamental, professoras do jardim de infância, assistentes de professora e auxiliares de enfermagem. Já aquelas que pareciam mais maduras tendiam a trabalhar como analistas de sistemas de computador, professoras de direito, atletas e chefes.

O efeito é observado entre políticos e também entre os líderes das empresas na lista Fortune 500; estes últimos geralmente têm características faciais mais dominantes do que a população em geral ou pessoas em outros cargos de status elevado.

Isso parece ser baseado em pura percepção, uma vez que empresas com CEOs com esse tipo de aparência não apresentam uma probabilidade maior de se sair melhor do que outras.

Mas há exceções. Curiosamente, homens negros que chefiam empresas no mesmo nível são mais propensos a ter feições de bebê.

Uma teoria é que isso se deve ao racismo implícito, o que significa que os homens negros geralmente são vistos como ameaçadores, então ter uma carinha de bebê acaba sendo uma vantagem porque suaviza essas impressões.

Outra pesquisa estabeleceu que, condizentemente com o estereótipo de que pessoas com carinha de bebê são calorosas e confiáveis, os CEOs de instituições sem fins lucrativos têm mais chance de ter esse tipo de semblante. Em média, as organizações com CEOs de aparência mais poderosa arrecadam menos dinheiro.

No mundo real, o tratamento contrastante de profissionais de aparência jovem costuma estar relacionado com a forma como as pessoas são tratadas com base em sua idade real.

Os trabalhadores mais jovens podem ser mais criticados do que os mais velhos, menosprezados por meio de linguagem depreciativa, receber um salário menor do que colegas mais velhos na mesma função, preteridos para uma promoção ou demitidos injustamente.

Na verdade, embora a sociedade ocidental tenha uma cultura bem documentada de fetichizar os jovens e marginalizar os idosos, a discriminação etária contra os profissionais mais jovens está cada vez mais sendo reconhecida.

O estudo de diversidade e inclusão de 2019 do site de busca de empregos Glassdoor mostrou que, no Reino Unido, jovens de 18 a 34 anos têm quase o dobro de chance de relatar serem discriminados com base na idade do que grupos mais velhos.

Reformulando nosso pensamento

No Reino Unido, há algumas proteções legais contra o preconceito relacionado à idade, independentemente de se basear na sua idade real ou na percepção dela — o que é conhecido como “discriminação por percepção”.

Enquanto isso, nos Estados Unidos, não há atualmente nenhuma lei específica para impedir o preconceito com base na aparência, embora tenha havido algum debate sobre como isso poderia ser implementado.

Em 1987, um artigo da Harvard Law Review propôs que a legislação existente deveria ser modificada para evitar a discriminação devido aos “aspectos amplamente imutáveis ​​da aparência corporal e facial”.

Tal como acontece com outras formas de preconceito, é possível que pessoas de certas origens raciais corram mais riscos.

Foi sugerido que parte do motivo pelo qual os asiáticos parecem estereotipicamente jovens para sua idade pode ser porque os traços da carinha de bebê são mais comuns neste grupo.

No entanto, há algumas coisas que as pessoas de aparência jovem podem fazer para ajustar a maneira como são vistas no ambiente de trabalho.

A opção mais óbvia é mudar sua aparência.

Uma pesquisa mostrou que mulheres de 20 e poucos anos parecem mais velhas quando usam maquiagem — embora, surpreendentemente, isso não seja verdade para faixas etárias mais avançadas —, e que adicionar maquiagem, calças e joias ao visual pode reforçar o quão competente uma mulher parece como líder.

Por outro lado, as pessoas veem os homens de barba como mais velhos e mais importantes do que aqueles sem barba. Eles também são geralmente vistos como mais capazes.

A pergunta é: você quer alterar sua aparência para resolver os preconceitos irracionais de outras pessoas?

Porventura, há uma alternativa. Nicola Simpson, uma coach de carreira executiva baseada em Londres, no Reino Unido, diz que se depara regularmente com essa questão — mas ela nem sempre está convencida de que a aparência de seus clientes é realmente o problema subjacente.

“Isso acontece com frequência quando os clientes vêm para uma sessão de coaching com falta de confiança e com uma sensação de síndrome do impostor”, diz ela.

Na experiência de Simpson, as pessoas podem ter dificuldade em lidar com a percepção de quão jovens aparentam ser em qualquer profissão, embora seja um pouco mais comum entre consultores de gestão e pessoas em cargos de liderança.

“Talvez eles estejam em um ponto em suas carreiras em que desejam transmitir liderança e seriedade, e sentem que parecem jovens para a idade que têm — e que isso está sendo usado contra eles”, afirma.

“Mas igualmente eles estão muitas vezes sentindo que ‘talvez eu seja jovem demais para ocupar uma posição gerencial’.”

Para superar isso, Simpson tenta ajudar seus clientes com o que está dentro do controle deles. Em vez de focar em como o mundo exterior os vê, ela tende a se concentrar em ajudá-los a entender de onde vêm suas ansiedades.

“Nossas conversas são mais sobre o que eles podem fazer para se sentirem mais confiantes — trazendo ferramentas para transformar seu pensamento em algo que seja muito mais positivo e favorável.”

Simpson sugere tentar prestar atenção em quando você é tomado pelo medo de como você é percebido e mudar conscientemente seus pensamentos para uma perspectiva mais positiva.

Se você projetar confiança, automaticamente vai parecer mais competente — independentemente dos preconceitos que estão realmente rondando a mente dos seus colegas de trabalho.



Fonte: G1