Alta da inflação pode induzir BC a elevar juro básico da economia pela primeira vez em sete anos | Economia


A forte inflação dos alimentos, dos combustíveis e do dólar, somada à tensão política, pode levar o Banco Central a aumentar nesta semana os juros básicos da economia. Caso se confirme, será a primeira elevação em quase sete anos — a decisão do BC sobre a taxa Selic, que tem por objetivo conter a inflação, será anunciada na próxima quarta-feira (17).

A última decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) que elevou a Selic é de julho de 2015. Na ocasião, a taxa passou de 13,75% para 14,25% ao ano. Depois disso, entremeada com períodos de estabilidade, a taxa caiu até atingir a mínima histórica de 2% anuais em agosto de 2020. Esse patamar foi mantido nos últimos sete meses.

Segundo a previsão da maior parte dos analistas, em pesquisa efetuada pelo BC na última semana com mais de cem instituições financeiras, a expectativa é de que a taxa suba para 2,25% ao ano na próxima quarta.

Há economistas, no entanto, que preveem um aumento ainda mais expressivo – para 2,50% ou até 2,75% ao ano.

Os analistas avaliam ainda que essa poderá ser apenas a primeira elevação na Selic, que serve de referência para o mercado financeiro. A previsão é de que a taxa suba para 4% ao ano até o fim de 2021, e para 5,5% ao ano até o fechamento de 2022.

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Impacto nas taxas bancárias

O diretor-executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel José Ribeiro de Oliveira, afirma que os juros bancários já vêm subindo desde o fim do ano passado – reflexo dessa tendência de alta da Selic.

Segundo Ribeiro, esse aumento nas taxas dos bancos vem acontecendo devido aos chamados “riscos fiscais” – aumento de gastos públicos – e também pela previsão de alta da inadimplência, além do quadro político e do ritmo lento da vacinação contra a Covid-19.

“Naturalmente, se o BC subir a Selic agora, vai ser um motivo a mais para subir os juros ao consumidor”, acrescentou.

O diretor da Anefac lembrou que, além da Selic, há outros fatores pressionando os juros bancários para cima:

“Não tem almoço grátis. O banco vai embutir [esses custos] nos empréstimos”, afirmou Ribeiro.

De acordo com o economista, o impacto da alta da Selic neste ano tende a ser maior ainda no crédito imobiliário, caracterizado por um prazo mais longo, de 30 a 35 anos, e volumes de recursos mais altos.

“Aí sim, por menor que seja o aumento, passa a ter impacto. Uma alteração de um ponto percentual [para cima na taxa de juro para compra da casa própria] vai dar uma diferença de mais de 10% no total pago com a taxa anterior”, apontou Ribeiro.

Crescimento, investimento e emprego

A elevação da taxa de juros, de acordo com analistas, também influencia negativamente o consumo da população e os investimentos produtivos, impactando, assim, o emprego e a renda.

Segundo o economista-chefe e sócio da Necton Investimentos, André Perfeito, a alta da inflação nos últimos meses está relacionada ao aumento dos preços dos alimentos, dos combustíveis e do dólar – alta que é repassada aos preços dos insumos e produtos importados.

“O juro [em 2% ao ano, atualmente] não cobre o risco de investir no Brasil hoje e isso tem feito o real se enfraquecer muito. Isso posto, o BC vai tentar atacar o custo de importação, tentando estabilizar a moeda norte-americana”, declarou.

A lógica é que uma alta do juro básico aumente a remuneração das aplicações financeiras no Brasil, estimulando o ingresso de recursos na economia e atenuando as pressões de valorização do dólar.

Inflação alta faz poder de compra do brasileiro diminuir
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O economista também afirmou que uma eventual alta dos juros, embora busque atacar a inflação dos custos, também vai gerar efeito na demanda por produtos e serviços, provocando contenção da atividade econômica.

“É como um remédio contra câncer que tem efeitos secundários que são ruins. Isso tem um efeito colateral na demanda, que nos preocupa. Crescer 3% este ano [conforme a previsão do mercado] é dizer que vai crescer nada por causa do tombo no ano passado. Vai parecer bom, mas porque a base é baixa. Na verdade, a gente vai ficar no zero a zero”, disse André Perfeito.

Aumento de gastos com juros

Gabriel Leal de Barros, sócio e economista-chefe da RPS Capital, lembrou em entrevista ao G1 que um aumento na taxa Selic também gera elevação de despesas com juros da dívida pública.

Segundo ele, a eventual alta da Selic de 2% para 4% ao ano, prevista pelos analistas do mercado, geraria uma despesa adicional de cerca de R$ 65 bilhões com juros da dívida (se mantida em 12 meses).

Embora os gastos com o auxílio sejam classificados como “primários” e as despesas com juros pertençam ao orçamento “financeiro”, ambos geram aumento da dívida pública brasileira — que somou cerca de 90% do Produto Interno Bruto (PIB) no fim de 2020, bem acima da média dos países emergentes (cerca de 60% do PIB).

Por outro lado, segundo Barros, o aumento do juro básico tende a minimizar a pressão de alta do dólar, o que poderia diminuir as despesas do Banco Central com os chamados “swaps cambiais” – instrumentos utilizados para intervir e impedir uma disparada maior da moeda norte-americana.

Porém, acrescentou Barros, isso acontece somente se o risco fiscal (aumento de despesas) e as tensões políticas não piorarem.

“É sempre difícil estimar câmbio, especialmente no Brasil. Mas eu diria que, no final do dia, é o risco fiscal que determinará qual será seu novo nível de equilíbrio, ainda que a Selic de curto prazo tenha influência importante”, finalizou.

Segundo Deibert Fernandes De Aguiar, coordenador da assessoria de investimentos da Terra Investimentos, as aplicações em renda fixa vão passar a ter um rendimento melhor com a elevação do juro básico da economia prevista pelo mercado para este ano.

Essa melhora acontecerá, entre outros, nos investimentos em títulos públicos, vendidos por meio do Tesouro Direto, além de Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCA). Ele lembrou que há incidência de Imposto de Renda sobre as aplicações no Tesouro Direto, mas não nas LCI e LCA.

Entretanto, a remuneração não será tão boa quanto o registrado anos atrás, quando a taxa Selic estava acima de 10% ao ano.

“O problema é nossa referência. O investidor ficou muito mal acostumado [com rendimento mais alto na renda fixa]”, disse.

No Tesouro Direto, o analista recomendou títulos pós-fixados, que acompanham a alta da taxa Selic, e observou que o investidor tem de tomar cuidado, nas LCI e LCA, para ter um rendimento acima da inflação.

“Como a inflação está alta, quem está aplicando em 100% do CDI [percentual próximo da Selic], está perdendo dinheiro”, disse.

Deibert Fernandes recomenda que os investidores apliquem em fundos imobiliários de recebíveis — aplicação que, segundo ele, “vai conseguir entregar mais rentabilidade para o investidor nos próximos 12 meses” — e que fuja da poupança, mesmo com o pequeno aumento na rentabilidade. A poupança rende 70% do juro básico da economia enquanto a taxa estiver abaixo de 8,5% ao ano.

PIB encolheu 4,1% em 2020, o maior tombo em 25 anos
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Fonte: G1