Veja quem são os PMs do Rio acusados de crimes violentos que vão disputar as eleições

O capitão Diogo Souza da Silveira (PSDB) é candidato a prefeito de Cabo Frio Foto: Reprodução
O capitão Diogo Souza da Silveira (PSDB) é candidato a prefeito de Cabo Frio. Foto: Reprodução

Policiais militares acusados de crimes violentos disputam o voto do eleitor do Rio. Um levantamento feito pelo jornal O GLOBO nas certidões criminais de PMs que apresentaram candidaturas no Estado revela que mais de 30 são réus ou já foram até condenados em primeira instância. Há agentes que respondem por homicídio, extorsão, corrupção e tortura; um deles é condenado por chefiar uma milícia.

Dos acusados, o único que disputa o cargo de prefeito é o capitão Diogo Souza da Silveira, candidato pelo PSDB em Cabo Frio. Ele é réu, junto com três outros agentes, pelo homicídio do estudante Igor Cordeiro de Manhães, de 13 anos, em março de 2012, durante operação da PM no Complexo da Mangueirinha, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Na ocasião, o adolescente foi atingido nas costas por quatro tiros de fuzil.

Os PMs, lotados à época no 15º BPM (Caxias), alegaram que apenas reagiram a ataque de criminosos. Diogo Souza — na ocasião, tenente e comandante da patrulha — atirou nove vezes. A investigação da Polícia Civil concluiu que Igor não estava armado, não integrava o tráfico na favela e foi executado pelas costas. Com base no inquérito, os quatro agentes foram denunciados. Em fevereiro de 2018, Antônio Alves Cardoso Junior, da 4ª Vara Criminal de Caxias, determinou que Souza e seus três colegas sejam levados a júri popular. A data do julgamento ainda não foi marcada.

Em sua campanha nas redes sociais, o capitão comemora ocorrências do batalhão de Cabo Frio, o 25º BPM, com mortes de criminosos: “Isso aqui é PMERJ, se colocar a cara pra fora vai se arrasar!”, publicou no dia 11 de setembro. Questionado sobre a acusação, o oficial argumentou, por meio de nota, que “na polícia, quem faz muito responde muito. Quem faz pouco responde pouco e quem não faz nada é promovido”. Souza não é o único envolvido na morte de Igor que disputa o voto do eleitor nessas eleições: o sargento Leonardo Antônio da Silva Araújo, o Léo Russo, que também é réu no processo, tenta uma vaga na Câmara dos Vereadores do Rio.

Um dos PMs da lista de candidatos começou o ano eleitoral preso. O sargento Wainer Teixeira Junior estava na cadeia até março, quando foi condenado a uma pena de cinco anos e três meses de prisão por chefiar a milícia que domina Maricá, na Região Metropolitana. De acordo com a denúncia do Ministério Público que culminou na condenação, a milícia comandada por Teixeira matou desafetos, traficantes e usuários de drogas para controlar vários bairros do município. Em setembro de 2018, por exemplo, o sargento deu ordem para matar antigos comparsas, “acusando-os de traição por não repassarem o dinheiro arrecadado com a segurança durante a prisão”.

Três semanas após a sentença, no entanto, o sargento foi beneficiado por uma decisão do desembargador Roberto Távora. No parecer que determinou a soltura de Teixeira, Távora cita a pandemia de coronavírus e defende que a Justiça deveria, “sem colocar em risco a sociedade ou a boa marcha processual, buscar, dentro dos parâmetros legais, afastar do cárcere aqueles já em condição de ficarem soltos”. Após ser libertado, o sargento apresentou sua candidatura pelo PSD. Hoje, ele usa o slogan “o respeito voltou” para pedir votos nas redes sociais para vereador em Maricá. Em outro processo, Teixeira é acusado de receber propina do tráfico, quando servia no 7º BPM (São Gonçalo), até 2016. O PM nega que chefie milícia e afirma estar sendo “acusado injustamente”.

Um dos agentes que vão tentar pedir votos mesmo com pendências com a Justiça é o sargento Bruno Demke Bernardo (Podemos), filho do deputado estadual Mauro Bernardo (Pros), um PM aposentado. Bruno, candidato a vereador em Cabo Frio, na Região dos Lagos, é réu num processo que corre na Vara de Arraial do Cabo por extorsão mediante sequestro. Ele é acusado de ter capturado, junto com um colega, um homem apontado como chefe do tráfico da região e levado para uma região isolada. No local, a dupla — que à época era lotada no Batalhão de Operações Especiais (Bope) — teria exigido dinheiro para não matá-lo.

O crime aconteceu em abril de 2013. Parentes da vítima alertaram PMs do batalhão local, que detiveram Bruno e o colega. Em depoimento à Corregedoria da PM, os agentes que abordaram o hoje candidato alegaram que os acusados do crime disseram que liberaram a vítima e que queriam “apenas dar um susto” nela. Já o traficante, em depoimento, afirmou que foi forçado a entrar num carro por homens encapuzados e “foi desacordado, tendo voltado a si numa praia”. Ele alegou que um dos homens se identificou como PM do Bope antes de começar a ameaçá-lo. O sargento — que, antes de se licenciar para concorrer, era lotado na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), onde o pai trabalha — nega ter cometido o crime e, em nota, afirma que “os fatos citados no processo não são verdadeiros”.

Outro sargento acusado de crime e que concorre nessas eleições também chegou a bater ponto na Alerj. Rafael Sousa de Campos, o Rafael Simplesmente Amigo (Avante), é candidato a vereador, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, e foi lotado, no ano passado, na 1ª vice-liderança do PSL na Alerj. Em fevereiro de 2018, Campos foi condenado a seis anos e oito meses de prisão por extorsão. De acordo com a sentença, ele tentou cobrar, em 2011, a pedido de um amigo, uma dívida de R$ 40 mil. O PM marcou um encontro com a vítima numa lanchonete e a ameaçou de morte. “Pode comprar o caixão e pode avisar a sua família que eu vou te matar, vou te atropelar!”, afirmou Campos, segundo o relato da vítima.

Após o encontro, o PM ainda foi até a casa da vítima e disse para o pai dela “abrir o olho porque senão ele iria dar um jeito na situação”, de acordo com a sentença. A vítima, com medo, vendeu a casa para poder pagar a dívida. Campos recorreu e responde em liberdade. Além da condenação, desde 2016, Campos é réu em outro processo no Fórum de Caxias, por homicídio.

IRMÃO DE EX-ASSESSORA DE FLÁVIO DIZ: ‘FALTA GENTE HONESTA’

O sargento Alex Rodrigues de Oliveira, o Alex Morreba (PSD), foi às redes sociais no último dia 4 fazer um desabafo contra a corrupção. “Recurso tem! Dinheiro tem! O que falta é gente honesta pra fiscalizar e administrar! Vamos juntos combater essa pouca vergonha!”, escreveu o candidato a uma vaga na Câmara dos Vereadores do Rio na legenda de uma imagem que mostrava uma reportagem sobre desvios na Saúde do estado. O discurso, segundo o Ministério Público, não está alinhado com a prática: Oliveira é acusado de integrar uma quadrilha de policiais que realizava batidas com o objetivo de recolher propinas.

O PM foi um dos presos, em agosto de 2018, na Operação Quarto Elemento. Entre os 48 denunciados na ocasião, havia 24 policiais civis — sendo dois delegados —, seis policiais militares e dois bombeiros. Segundo o MP, o grupo buscava identificar possíveis infratores da lei e seu potencial econômico. Eram, então, realizadas “operações” com o objetivo de flagrá-los cometendo crimes ou irregularidades administrativas. Nesses casos, em vez de seguir a lei, os suspeitos exigiam dinheiro para não prender os infratores nem apreender mercadorias. Oliveira teve a prisão revogada no final de 2018 e responde ao processo em liberdade. Ele é irmão de Valdenice de Oliveira Meliga, que foi lotada no antigo gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).

Outros PMs conseguiram se livrar das acusações a que respondiam às vésperas do pleito. É o caso do sargento Antônio Maria Ferreira, o Tunho do Bope, candidato a vereador de Teresópolis pelo Avante. O PM foi absolvido em segunda instância em agosto, dois meses antes do início da campanha. Ele havia sido denunciado pelo MP junto com outros três agentes por envolvimento na morte do entregador de pizza Rafael Camilo Néris, no Morro da Coroa, na Região Central do Rio, em junho de 2015.

O jovem foi morto, aos 23 anos, com três tiros nas costas em meio a uma operação do Bope. Ferreira foi denunciado pelo MP pelos crimes de fraude processual, por ter ajudado na remoção ilegal do cadáver e na apresentação de material falso na delegacia, e falso testemunho, por ter afirmado em depoimento, que, com Rafael, os policiais encontraram um coldre — o que não foi confirmado pela investigação.

Em julho do ano passado, os agentes foram absolvidos em primeira instância. Segundo o juiz Daniel Werneck Cotta, da 2ª Vara Criminal, não há “suficientes indícios de autoria” para levar os agentes a júri. O MP, entretanto, recorreu, mas a 2ª Câmara Criminal manteve a decisão: “O fato de o agente ter trocado tiros com marginais da lei e de ter dialogado com a vítima antes de seu falecimento, não traz indícios suficientes de autoria do crime contra a vida”, escreveu o relator, Antônio José Ferreira Carvalho.

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©Plantão dos Lagos
Fonte: Jornal O Globo
Fotos: divulgação