Menino já teve pneumonia 15 vezes aos 6 anos: ‘tem hora que ele fala: mamãe, eu não aguento mais!’ | Região dos Lagos


Neste domingo (28) é o Dia Mundial das Doenças Raras, data criada em julho de 2018 com o objetivo de divulgar e discutir os desafios enfrentados por quem vive numa condição que afeta 65 a cada 100 mil pessoas. É o caso do menino Samuel Costa Ferreira, de 6 anos, morador de Maricá (RJ), que já teve pneumonia 15 vezes.

A família contou ao G1 os desafios que vem enfrentando ao lidar com a Imunodeficiência Comum Variável Primária, uma doença genética que não tem cura e afeta o sistema imunológico provocando falhas na produção de células de defesa.

Pais de Samuel contam os desafios de lidar com a doença rara do filho — Foto: Arquivo Pessoal

Samuel teve a primeira pneumonia aos 2 meses de vida. Os medicamentos orais não fizeram efeito, e o menino precisou ficar internado recebendo medicação na veia por seis longos dias. A doença veio novamente dois meses depois da recuperação. Logo em seguida, vieram as crises de sinusite. Antes de completar um ano, ele teve pneumonia três vezes.

Samuel no tratamento da Imunodeficiência Comum Variável Primária, doença rara e sem cura — Foto: Arquivo Pessoal

O primeiro tratamento de saúde começou com um pneumologista, que tratou o problema como asma, mas nem os remédios e nem os cuidados excessivos adiantavam. Até os 6 anos de idade, a família contou, além das 15 pneumonias, várias outras doenças.

A mãe de Samuel, Elenise Costa Ferreira, relata que passou por muitas noites difíceis.

“Ele chorava, tinha febre, e eu pensava ‘vou perder meu filho’. Ele não dormia, ele não comia, ele só vomitava”, contou.

Elenise tinha a sensação de que o menino, ainda de colo e tão pequeno, era de porcelana. A mãe explica que toda vez que Samuel tinha contato com o mundo acabava ficando doente.

Com menos de um ano, Samuel, que tem doença rara, teve três pneumonias — Foto: Arquivo Pessoal

“O Samuel é uma criança que sempre ficou muito doente. Aos 2 meses ele ficou internado pela primeira vez, quando ele teve uma pneumonia, e a partir daí foi um processo. Ele começou a fazer um tratamento como se fosse asma e nada surtia efeito. Trocamos de médico, mas mesmo assim sempre ele continuava com muitas infecções. Se ele brincasse na areia, dava infecção de pele. Se ele ia à praia, ficava com febre. Se ele brincasse com um colega gripado, pegava uma pneumonia. Quase todo fim de semana eu estava no pronto-socorro”, explica a mãe.

O diagnóstico e tratamento

O primeiro desafio foi encontrar um médico que desse o diagnóstico correto de Imunodeficiência Comum Variável Primária, isso depois de muitos exames. Samuel quase não tem imunidade contra doenças, e até as mais simples causam um impacto muito grande na saúde. Algumas vacinas não têm efeito no organismo dele.

No Brasil, as imunodeficiências primárias são consideradas raras porque pouquíssimos casos são descobertos. De acordo com a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, “cerca de 80% das Doenças Raras são decorrentes de fatores genéticos, enquanto os outros 20% advêm de causas ambientais, infecciosas e imunológicas”.

Além da doença não ter cura, a família conta que o tratamento não é nada fácil. O menino é submetido a uma aplicação que leva de 6 a 7 horas para ser finalizada, já que precisa ser injetada na veia lentamente. Além disso, há riscos de reações, como febre e dor nos ossos.

Samuel passa de 6 a 7 horas recebendo aplicação de medicamento na veia em tratamento contra a doença — Foto: Arquivo Pessoal

“O maior desafio hoje é vê-lo receber a medicação. Ele tem que tirar sangue no mínimo duas vezes por mês, fora o dia que ele faz a infusão. Ele chega ao hospital às oito da manhã e sai às nove da noite. Ele fica o dia inteiro com a agulha no braço, com medicamento caindo. Uma criança tomando soro todo mês, tem hora que ele fala: ‘mamãe eu quero ir embora, mamãe eu não aguento mais’… e aí nesse momento a gente fica com o coração apertado”, conta a mãe.

Em seu desabafo, a mãe relata ainda que sempre tomou cuidados extremos na tentativa de evitar que o filho ficasse doente.

“Um sofrimento muito grande. Primeiro porque, como mãe, a gente acha que pode evitar tudo, a gente acha que tem controle sobre tudo, e a gente não tem. Eu sofria de muita ansiedade porque eu achava que a saúde dele dependia de mim. Vê-lo sofrer me causava muito sofrimento e eu achava que podia evitar, então a alimentação sempre foi muito regrada, higiene fora do comum, tudo dele era lavado a mão e passado, era tudo muito certinho porque eu achava que assim ele não ficaria doente. Eu evitava que ele brincasse com muitas crianças, que colocasse a mão na terra. Ao mesmo tempo, muitas pessoas diziam ‘deixa ele pegar imunidade’, sendo que no caso dele essa imunidade nunca viria”.

A situação exigiu muita força da família, e a união dos pais fez toda a diferença.

“Foi uma notícia complicada de aceitar a princípio, a gente não sabia como lidar e, para mim, foi bem difícil. Mas ele está superando, está bem”, conta o pai de Samuel, Ronald Ferreira.

Em 2014, o Ministério da Saúde determinou que o SUS desse incentivos financeiros à compra de medicamentos dos pacientes, mas a imunoglobulina, que estimula a produção de células imunológicas, não é tão fácil assim de encontrar. O medicamento, que repõe o que o organismo não produz, vem de doadores de sangue e tem um alto custo.

Imunodeficiente na pandemia

O cuidado com a saúde de Samuel teve que ser redobrado durante a pandemia, já que para os imunodeficientes o risco é ainda maior. A família tem evitado o contato com pessoas de fora e o menino precisou deixar de brincar com outras crianças. Ronald, que trabalhava em um hospital, precisou sair do emprego.

“Esse último ano foi muito difícil. Meu marido trabalhava em um Hospital aqui de Maricá e precisou deixar o trabalho. Nos primeiros meses eu achei que eu fosse surtar. Se um vírus da gripe causa uma pneumonia nele, a gente não sabe o que o coronavírus pode causar no corpo dele. Ele depende que as outras pessoas se imunizem para que as doenças não cheguem até ele”, desabafa a mãe.

Apesar da situação, a família conta que Samuel é sempre alegre, brincalhão e carinhoso.

“Ela falou que me ama muito, e eu amo muito ela e o papai também. Eu sinto muita saudade quando eu estou longe”, disse o menino.

Samuel, aos 6 anos, já teve pneumonia 15 vezes por causa da Imunodeficiência Comum Variável Primária — Foto: Arquivo Pessoal



Fonte: G1