Atrito com o ar, giros e areia: especialistas explicam como celular ‘sobreviveu’ após queda de avião

“Como isso é possível?” Certamente essa foi a pergunta que pairou sobre a cabeça de quem viu a notícia do celular que caiu de uma altura de 300 metros e foi encontrado intacto pelo dono no dia seguinte. O caso aconteceu durante um sobrevoo na Praia do Peró, em Cabo Frio, na Região dos Lagos do Rio de Janeiro, na última sexta-feira (11/12). Ao cair, o celular ainda continuou filmando a trajetória até o chão — o aparelho foi localizado em uma área de restinga das Dunas do Peró, por uma função de rastreamento por GPS. Para especialistas, uma junção de fatores, como atrito com o ar, giros e areia, pode explicar como e porquê o celular resistiu. Entenda abaixo.

FATOR ATRITO COM O AR

Especialistas informaram que o celular chegou ao solo numa velocidade aproximada de 72km/h, usando a equação que divide o espaço sobre o tempo de deslocamento e que já considera o atrito com o ar. Essa fórmula, da área da cinemática e que não depende do peso do aparelho, traz apenas uma estimativa de velocidade, visto que conforme o celular vai modificando sua posição ao longo da queda, a superfície em atrito com o ar muda, interferindo na velocidade.

“A resistência do ar faz com que o celular possa ter uma velocidade limite. É o mesmo efeito que um paraquedas faz […] Quando o paraquedas é aberto, cria-se uma força de resistência (atrito com o ar) que faz com que nossa velocidade na queda aumente até um certo limite. Se não houvesse o ar, considerando ainda a gravidade, o celular chegaria a uma velocidade de aproximadamente, 276 km/h, utilizando a equação de Torricelli”, explica o professor de física da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Julio Cesar Tedesco. Ainda de acordo com o engenheiro mecânico Damiano Militão, o formato do celular também contribuiu para que o aparelho resistisse.

“Como o celular é bem plano e tem grande área de contato com o ar, a velocidade atingida não chega ser assim tão gigante e não aumenta infinitamente. Aí, dependendo da rigidez do local onde ele bate, pode resistir sim. Talvez, caindo de um lugar mais baixo, mas batendo numa superfície mais rígida, poderia danificar mais”, explica o engenheiro.

QUEDA NA AREIA

O celular do ambientalista e documentarista Ernesto Galiotto caiu em uma área de restinga das Dunas do Peró. Para o físico, engenheiro e também professor da Uerj, Leandro Ratamero, a natureza pode ter ajudado nesse final feliz tecnológico.

“A questão da areia pode ser um tanto controversa. Se você coloca o pé em cima da areia e arrasta para frente você sente que a areia não oferece resistência ao escorregamento. Agora, se você bater o pé na areia, você vai sentir que é ela é muito rígida. Se o celular caiu na horizontal ele deslizou na areia. Mas ali também tem outro fator, que é a vegetação. De repente, antes de atingir a areia, o celular atingiu alguma vegetação. Se ele atingiu alguma vegetação, ele pode ter tido um amortecimento na queda antes de atingir a própria areia”, acredita Ratamero.

Uma câmera da cabine do avião monomotor registrou o momento em que Ernesto pega o celular para filmar o local. Enquanto gravava, ele segura o celular apenas com uma mão. O trajeto da queda livre, que durou cerca de 15 segundos, também foi registrado em vídeo pelo próprio celular, um iPhone modelo 6S, que tocou o solo gravando toda ação.

Nas imagens que mostram o trajeto do celular até o chão, é possível perceber que ele gira no ar. Para o professor, isso também pode ter contribuído para que o aparelho chagasse quase intacto.

“O celular, por ser plano e por estar girando, como vimos na imagem, cria uma resistência aerodinâmica que faz diminuir ainda mais a velocidade de queda, mesmo sendo lançado de grandes alturas”, explica Ratamero.

MATERIAL DO CELULAR, TECNOLOGIA E… SORTE

O celular de Ernesto foi encontrado por uma função de rastreamento por GPS. Para o técnico em celulares especializado em iPhones, Marcio Lima, o desfecho positivo é uma combinação entre física e tecnologia.

“A carcaça do iPhone é feita de uma liga que também é utilizada em algumas bicicletas de competição — o material é chamado de serie 7.000 — e vidro de ion reforçado. Além da estrutura da carcaça ser feita de uma peça única, sem emendas que podem enfraquecer a mesma. O fato de ter caído com a tela para baixo facilitaria a quebra da tela e também da carcaça, mas ter caído na areia contribuiu para a tela permanecer inteira”, acredita Marcio. De acordo com o técnico, no entanto, a resistência não é uma exclusividade da marca.

“Existem outros celulares que poderiam ter resistido à queda, visto que hoje existem celulares com capacidade de suportar grandes impactos. São vendidos justamente com este apelo de serem super resistentes, mas são poucos. Realmente o diferencial pode ter sido a areia juntamente com a carcaça feita em uma peça única”, afirma Marcio.

Apesar da ciência e da tecnologia conseguirem traçar hipóteses pelas quais o celular de Ernesto resistiu após uma queda impressionante, o professor de física Julio Cesar confessa que existe uma boa dose de sorte nesse cálculo. “Tudo isto acaba ajudando a gente a entender que o impacto pode ter sido minimizado, mas é uma baita sorte do cara”, brinca Julio Cesar.

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Fonte: Redação / Plantão
Fotos: divulgação