A desaprovação de contas não enseja a causa de inelegibilidade

Alexis Gabriel Madrigal*

A Lei de Inelegibilidade estabelece, com base no artigo 14 da Constituição Federal, as hipóteses que geram o impedimento ao eleitor de se eleger.

É cógnito que a lei em menção visa proteger a normalidade e a legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico e do abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração pública direta e indireta.

Por este ângulo o art. 1º, I, g, da LC no 64/1990 (Lei das Inelegibilidades), define serem inelegíveis para qualquer cargo:

os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos oito anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição”.

Ocorre que não é toda rejeição de contas que resulta contiguamente na inelegibilidade do candidato. Máxime ao ser afastada a existência de dolo, um elemento imprescindível para configuração da causa de inelegibilidade.

Nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal – STF, “nem toda desaprovação de contas enseja a causa de inelegibilidade do art. 10, inciso 1, alínea g, da LC nº 64/1990, somente as que preenchem os requisitos cumulativos constantes dessa norma, assim enumerados: i) decisão do órgão competente; ii) decisão irrecorrível no âmbito administrativo; iii) desaprovação devido a irregularidade insanável; iv) irregularidade que configure ato doloso, de improbidade administrativa; v) prazo de oito anos contados da decisão não exaurido; vi) decisão não suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário.” (AgR-REspe nº 3213-731PR, Relator Min. Gilmar Mendes, DJe de 21.11.2016).

É relevante considerar, a propósito, que o § 6.º do art. 37 da Constituição, ao estatuir a regra geral da responsabilidade civil objetiva do Estado, preservou, quanto a seus agentes causadores do dano, a responsabilidade de outra natureza, subordinada a casos de dolo ou culpa. Ou seja, faz-se necessário analisar e provar o elemento subjetivo da culpa ou do dolo.

Sendo assim, é de meu entendimento que o dolo consiste na vontade consciente do agente em realizar a sua conduta em contrariedade a uma vedação normativa. Em outro plano, o penal, a doutrina o divide em dolo direto, quando a vontade do agente é dirigida à realização do fato típico, e o dolo eventual, que se dá nas hipóteses em que o agente não almeja diretamente a realização do tipo, mas tem consciência de que a sua conduta pode se qualificada, assumindo, de tal forma, os riscos da produção do resultado.

Por essa razão, não se deve confundir a mera ilicitude da conduta do agente público, pois não constitui automaticamente um ato de improbidade administrativa, assim como a reprovação de contas não gera inelegibilidade automática.

Da mesma forma, é cristalizada a interpretação de que “nem toda rejeição de contas enseja a inelegibilidade do ad. 11, 1, g, da LC 64/90“, no entendimento do Min. João Otávio de Noronha:

“à Justiça. Eleitoral verificar a presença de elementos mínimos que revelem má-fé, desvio de recursos públicos., dano ao erário, reconhecimento de nota de improbidade, grave violação a princípios, dentre outros, isto é, circunstâncias que revelem a lesão dolosa ao patrimônio público ou o prejuízo à gestão da coisa pública” (AgR-RO nº 1216-76/SP, Rei. Mm. João Otávio de Noronha, PSESS de 11.11.2014 – destaquei).

A conduta precisa se enquadrar em um dos tipos normativos arrolados nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei 8.492/92. Vale menção o art. 10, no que lhe concerne, prevê como núcleo do tipo as ações ou omissões, dolosas ou culposas, que ocasionem “perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades” objeto da Lei de Improbidade

Conclusão:

É preciso verificar elementos mínimos que revelem o ato de improbidade administrativa praticado na modalidade dolosa, pois não havendo comprovação da má-fé do gestor público, não se há de falar em crime, ou inelegibilidade automática por rejeição de contas.

Sendo assim, para fins de verificação da incidência ou não de causa de inelegibilidade, faz-se necessária a análise dos demais requisitos previstos no artigo 11, inciso 1, alínea g, da Lei Complementar 64/90, qual seja, a existência de irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa.

Durante algum tempo, o Tribunal Superior Eleitoral entendeu que a análise do que configuraria irregularidade insanável e ato doloso de improbidade administrativa implicaria “juízo em tese”. Porém, esse nexo é superável, visto que não se deve confundir a mera ilicitude da conduta do agente público, pois não constitui automaticamente um ato de improbidade administrativa, assim como a reprovação de contas não gera inelegibilidade automática.

* Possui graduação em Gestão Pública pela Universidade Norte do Paraná (2017), Pós Graduação em Administração Pública e Gerência de Cidades no Centro Universitário Internacional.

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