depoimento da avó de Kathlen indica que ‘não há indícios de confronto que justificasse disparo de arma de fogo’ por PMs


Algumas horas após terem prestado depoimento ao Ministério Público do Rio sobre a morte de Kathlen Romeu, os parentes da jovem de 24 anos, que estava grávida de 4 meses quando morreu ao ser baleada no Complexo do Lins, no último dia 8 de junho, voltaram ao prédio do órgão para que a avó, Sayonara Fátima, que estava com a vítima quando tudo aconteceu, falasse novamente sobre o que testemunhou naquela tarde. Desta vez, a oitiva foi dada para uma outra investigação do MP que apura se houve crime militar por parte dos 12 policiais da UPP Lins que participaram da ação. Instantes após a saída da família, Paulo Roberto Mello Cunha Júnior, promotor do MPRJ junto à Auditoria de Justiça Militar, comentou sobre o andamento desta apuração paralela e revelou que o depoimento de Sayonara leva a crer que não houve razão para confronto. Ele, no entanto, pondera que muitos elementos ainda serão apurados.

– Hoje nós ouvimos a testemunha presencial, que é a avó da Kathlen, a dona Sayonara, e o que a gente pode adiantar, sem fazer qualquer juízo de valor a respeito da investigação como um todo, mas em relação ao depoimento que ela prestou, é que a gente não encontra indícios de que tenha havido efetivamente um confronto que justificasse um disparo de arma de fogo por parte dos policiais. Mas reforço que é o que se depreende do depoimento da testemunha. Teremos outras diligências, como a reconstituição feita pela Delegacia de Homicídios, o depoimento dos policiais, elementos que vão formar o inquérito – disse o promotor.

Kathlen estava grávida de quatro meses
Kathlen estava grávida de quatro meses Foto: Instagram / Reprodução

O promotor explicou também a diferença entre a investigação principal em curso, que é sobre o homicídio da jovem, e a secundária, feita pela promotoria junto à auditoria de Justiça Militar, que investiga se houve crime militar, além do homicídio. Segundo Paulo Roberto, é investigada nesta esfera, por exemplo, a possibilidade de fraude processual, por conta de denúncias de que os PMs teriam recolhido projéteis após a ação.

– Há um crime principal, mais grave, que é um homicídio doloso, que é investigado pela Justiça comum, Civil, pela Delegacia de Homicídios e pela promotoria de investigação penal, que também instaurou um procedimento de investigação independente do Ministério Público; e existe uma apuração na área militar, que é conexa a este homicídio e que vai apurar a eventual existência de outros crimes de natureza militar. Aqui estamos apurando a ocorrência de eventual crime militar conexo a este homicídio – explicou. – Em tese, a gente pode falar, por exemplo, de fraude processual, porque existe a possibilidade de eles terem retirado cartuchos do local, existe também a possibilidade de associação para violência, ou seja, a gente tem que averiguar o que eles estavam fazendo lá, se a presença deles lá era regular dentro da sistemática militar, se houve descumprimento de missão ou abandono de posto.

Família de Kathlen Romeu chega para depoimento no Ministério Pùblico
Família de Kathlen Romeu chega para depoimento no Ministério Pùblico Foto: Maria Isabel Oliveira / Agência O Globo

‘Emoção muito forte’

No início da tarde, a famíla de Kathlen falou brevemente com a reportagem na chegada ao Ministério Público. Ao lado da avó, Sayonara Fátima, estavam também a mãe, Jackelline Oliveira e o pai, Luciano Gonçalves. O procurador da Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ, Rodrigo Mondego, também os acompanhou.

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Muito abalada, a mãe de Kathlen disse que espera que os novos depoimentos dados pela família possam ajudar na busca por justiça. Mas, questionada, disse, emocionada, não saber definir o que seria justiça de fato neste momento.

— A definição de justiça é muito ampla, não sei definir o que é justiça quando se perde um filho. Mas é o mínimo. A gente pede o mínimo que se espera num caso desse — disse. — A única esperança que eu tenho é de que o estado me ajude de alguma forma a fazer Justiça.

Reprodução simulada marcada para 14 de julho

Os parentes também confirmaram que foram comunicados sobre a reprodução simulada da morte de Kathlen, que será realizada no dia 14 de julho, no Lins, com horário previsto para o meio-dia.

— Só peço que Deus me dê forças para colaborar o máximo possível. Eu não tenho mais palavras… A emoção está muito forte — disse a avó, Sayonara. Ela estava com a neta quando a jovem foi baleada.

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Ao todo, 12 policiais militares da UPP do Lins que participavam da ação estão afastados enquanto durar a investigação, e estão responsáveis apenas por trabalhos administrativos. Dois deles teriam efetuado disparos naquela tarde do dia 8 de junho.

O caso

A designer Kathlen Romeu, de 24 anos, grávida de 4 meses, morreu no dia 8 de junho, no Complexo do Lins, segundo a família e moradores, vítima de uma bala perdida durante confronto entre policiais da UPP e traficantes.

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A PM, em nota na ocasião, afirmou que os policiais foram atacados a tiros por bandidos numa localidade conhecida como “Beco da 14”, e que houve confronto. De acordo com a corporação, Kathlen foi encontrada baleada após o tiroteio, foi socorrida para o Hospital Municipal Salgado Filho, mas não resistiu.



Fonte: Fonte: Jornal Extra