Morrem idoso de 93 anos e criança de 1 ano transferidos do Hospital de Bonsucesso após incêndio


Após sofrer uma angústia de mais de 30 horas numa peregrinação para encontrar o pai, de 93 anos, que estava internado no terceiro andar do prédio 1 do Hospital Federal de Bonsucesso e foi transferido por causa do grande incêndio que atingiu a unidade na semana passada, a família de Ciro Amorim Segtovich está de luto. Também nesta segunda-feira, foi confirmada a morte de uma menina de apenas 1 ano no sábado, que tinha um quadro grave de pneumonia e havia sido a última transferida do HFB, levada para a CTI neonatal do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG), no Fundão.

A certidão de óbito emitida pelo Hospital de Campanha do Riocentro, para onde foi transferido, aponta que ele faleceu às 8 horas deste domingo. Mas o documento não indica a causa da morte, segundo a pensionista Rita Segtovich, de 63 anos, filha do idoso. Mas ela não tem dúvidas de que o pai morreu vítima de Covid-19.

— Ele faleceu ontem e, segundo a declaração de óbito, foi às 8h. Foi por Covid-19. Mas eles não botaram isso no laudo. Lá onde ele estava é hospital de Covid, mas eu achava que ele não estava com vírus, pois já tinha tido. Ele era cardíaco. Meu pai testou negativo para o coronavirus tanto no Hospital (Estadual) Getúlio Vargas, onde ele esteve antes de ser transferido para o Hospital de Bonsucesso, e também lá ele testou negativo. Todos nós testamos negativo. Mas ele já tinha tido Covid-19 no início. E eu também, e a gente se curou com remédio de gripe em casa. A gente não sabia o que era. Pensávamos que era gripe, mas ele não se curou — contou a filha, que está tratando dos trâmites para o sepultamento, a ser realizado sem velório.

Ciro Amorim Segtovich, de 93 anos, foi transferido para o Hospital de Campanha do Riocentro após o incêndio no Hospital de Bonsucesso
Ciro Amorim Segtovich, de 93 anos, foi transferido para o Hospital de Campanha do Riocentro após o incêndio no Hospital de Bonsucesso Foto: Arquivo pessoal / Reprodução

Segundo ela, o idoso deu entrada no Hospital de Bonsucesso no dia 29 de setembro, com pneumonia e suspeita de Covid-19. Ele ficou em isolamento por dez dias, até que um teste deu resultado negativo para o novo coronavírus. Com isso, Ciro foi transferido do Covidário (ala reservada para pacientes com a doença) para a unidade pós-operatória, no mesmo prédio, onde podia receber visitas regulares de parentes.

— O teste rápido (feito recentemente) deu positivo, mas estávamos aguardando o resultado daquele teste mais completo (PCR), que demora até dez dias — contou Rita.

Na semana passada, Rita contou ao EXTRA a via-crúcis que cumpriu para localizar o pai depois de ser retirado do Hospital Federal de Bonsucesso. A família foi informada de que ele teria sido transferido às pressas para o Hospital Estadual Anchieta, no Caju. No entanto, o idoso não deu entrada na unidade, e Rita deu início à peregrinação em busca do pai. Somente no início da noite de quarta-feira, dia 28, após o drama ser contado na reportagem do EXTRA, descobriu-se que Ciro foi transferido, na verdade, para o Hospital de Campanha do Riocentro, na Zona Oeste da cidade.

Em nota, a direção do Hospital Federal de Bonsucesso pediu desculpas pelo ocorrido: “lamentavelmente houve um erro de informação por parte desta unidade hospitalar, ao familiar, sobre a transferência do paciente Ciro Amorim”. A direção informou à época que corrigiu a informação e indicou à família sobre o local para onde o paciente foi transferido.

Mas Rita quis saber porque o pai, que não estava diagnosticado com Covid-19, foi encaminhado para uma unidade de campanha criada exclusivamente para receber pacientes infectados com o novo coronavírus.

— Recebi a informação da assistente social do hospital que ele foi transferido para o Hospital de Campanha do Riocentro. Questionei porque ele foi pra lá, já que não estava com Covid, e explicaram que abriram uma nova ala para esses pacientes — desabafou Rita.

A última vez que Rita havia conversado com o pai foi no domingo retrasado, dia 25 de outubro. Na segunda-feira, um sobrinho foi visitá-lo e na terça-feira as visitas foram suspensas por causa do incêndio.

Último paciente

Um dia após um incêndio atingir o prédio principal do Hospital Federal de Bonsucesso, o último paciente internado a deixar a unidade foi uma menina de apenas 1 ano. O tratamento para se curar de uma pneumonia, que a levou ao estado grave, foi continuado no CTI neonatal do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG), localizado na Ilha do Fundão, também na Zona Norte. Três dias depois, a criança não resistiu e morreu no sábado.

A pequena paciente deixou o HFB na noite da última quarta-feira, dia 28. A transferência emociono os profissionais de saúde do hospital que celebraram com um aplauso coletivo.

Durante toda a terça-feira, dia do incêndio na unidade, profissionais de saúde e funcionários trabalharam para retirar os pacientes dos prédios. Primeiro no bloco principal, onde estava o foco do incêndio. Até mesmo uma loja de autopeças foi usada como QG para abrigar as pessoas internadas que chegavam ainda carregadas nas macas enquanto era aguardada a retirada por ambulâncias.

Em nota, a Superintendência Estadual do Ministério da Saúde no Rio confirmou que, na quarta-feira, 192 pacientes foram transferidos, 37 receberam alta e três vieram a óbito durante as tranferências. O número de mortes, no entanto, aumentou desde então, somando sete desde este domingo, dia 1º.

Mortes após incêndio

As primeiras mortes confirmadas, logo depois do fogo, foram de Núbia da Silva Rodrigues, de 42 anos, e e Eleozina Sant’Ana de Aguiar, de 83 anos, que deu entrada no local no dia 13 de outubro. As duas estavam internadas com covid-19 e não resistiram à transferência às pressas.

No fim da noite de terça-feira, o Ministério da Saúde comunicou também a morte de Marco Paulo Luiz, de 39 anos. Ele estava no CTI do Hospital de Bonsucesso e faleceu depois de ser levado para outro prédio.

A quarta vítima que morreu após incêndio foi uma idosa, de 73 anos, que tratava uma doença cardíaca avançada. Ela morreu, na quarta-feira, no Hospital Municipal Souza Aguiar. Um idoso de 70 anos, diagnosticado com Covid-19, foi confirmado como a quinta morte após as transferências. Ele estava internado no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, em Acari, e morreu na manhã da última sexta-feira, dia 30.



Fonte: G1