Quando alinhou a Sauber no grid do GP da Austrália de F1, em março deste ano no circuito de Albert Park, o brasileiro Gabriel Bortoleto era o piloto novato que chegava com a menor experiência com carros da F1. Apesar dos títulos na F3 e F2 em seu primeiro ano em cada categoria, o brasileiro ainda era visto no paddock como uma incógnita –a ponto de ser chamado por Helmut Marko, consultor da Red Bull, como “piloto B” na véspera da prova australiana.
Seis meses depois, a imagem do brasileiro é completamente diferente. Ao lado de Isack Hadjar, da Racing Bulls, é considerado o melhor novato do ano, superando até mesmo outros nomes mais badalados e em equipes de ponta, como Kimi Antonelli, na Mercedes. Após marcar pontos pela primeira vez na F1 no GP da Áustria, Bortoleto emendou uma série impressionante de bons resultados, marcando pontos com consistência e sempre à frente de seu experiente companheiro de equipe, Nico Hulkenberg, que tem mais de 240 corridas na F1.
Não por acaso, o nome de Bortoleto começou a ser mencionado em vagas onde os pilotos atuais não estão entregando a performance esperada –caso da própria equipe Red Bull. Bernie Ecclestone, antigo dono da categoria e nome influente no paddock até hoje, disse que Bortoleto seria o nome ideal para uma equipe como a Ferrari, no lugar de Lewis Hamilton.
O brasileiro, no entanto, faz questão de dizer que segue focado no projeto de longo prazo com sua atual equipe, que se tornará Audi a partir de 2026. Bortoleto já tem contrato para a próxima temporada –ou até mais anos com o time, já que a duração do acordo não foi divulgada. O fato é que o piloto da Sauber admite que sua imagem no paddock é outra, como contou em entrevista exclusiva para Folha em Baku, na véspera do GP do Azerbaijão.
“Obviamente é bom você ter um progresso no ano como eu tenho tido: é legal ver o avanço. Eu comecei com pouca quilometragem, e eu tenho sido capaz de evoluir muito durante o ano, aprender, revisar corridas anteriores e ver o que eu poderia ter feito melhor. Eu acho que essa é uma filosofia que a gente tem. E óbvio, eu estou bem comprometido no projeto em que estou. Já falei isso algumas vezes. É claro que, se você tem bons resultados, acaba chamando atenção. Isso é comum quando você está fazendo um bom trabalho. Mas a gente está bem focado no projeto que a gente tem e vamos continuar lutando”, diz Bortoleto, que foi o 11º colocado em Baku.
É claro que, se você tem bons resultados, acaba chamando atenção. Isso é comum quando você está fazendo um bom trabalho. Mas a gente está bem focado no projeto que a gente tem e vamos continuar lutando
No campeonato, o brasileiro segue atrás de Hulkenberg na tabela de pontos, especialmente por conta do pódio do alemão no GP da Inglaterra, disputado sob pista molhada em Silverstone. Só ali, o alemão marcou 15 pontos –ele tem 37 contra 18 do brasileiro. Mas, desde a Inglaterra, apenas Bortoleto marcou pontos na Sauber, mostrando a evolução do piloto que faz em 2025 sua estreia na F1. “Quando você tem bons resultados, as pessoas começam a te respeitar um pouco mais. Isso é comum, acho que em qualquer categoria que você participe do mundo”, disse Bortoleto.
O GP da Hungria foi especialmente marcante para a carreira do brasileiro até aqui. Além de conseguir seu melhor resultado na categoria (sexto lugar), ficou à frente de carros como a própria Red Bull de Max Verstappen. Foi também Bortoleto que insistiu para que a Sauber mudasse o ajuste do carro para torná-lo mais competitivo no travado circuito de Budapeste, e as mudanças sugeridas pelo brasileiro funcionaram.
A maturidade demonstrada no trabalho em equipe também é destacada como ponto a favor de Bortoleto com esta nova imagem do brasileiro na F1, como explica Jonathan Wheatley, chefe de equipe da Sauber. Com mais de 30 anos de experiência na categoria, em equipes como Benetton, Renault e Red Bull, o britânico trabalhou com campeões como Michael Schumacher, Fernando Alonso, Sebastian Vettel e o próprio Verstappen –ele deixou o time austríaco na temporada passada.
À Folha Wheatley afirmou ter bastante orgulho da temporada de estreia de Bortoleto na F1 até aqui.
“Quando você contrata um piloto jovem, você tem que ter uma visão a longo prazo. O que me impressionou com o Gabriel foi a sua ética de trabalho. Seu desejo de conseguir o melhor de todos ao redor dele, de cada um dos engenheiros, de todos ao redor dele. Sua fome por conhecimento e guia, e o que eu posso fazer melhor. E ele e eu passamos muito tempo falando sobre isso, e ele e o Mattia [Binotto, chefe do projeto Audi na F1]. E olha o que Bortoleto está fazendo, ele está rápido, tem apenas 20 anos. É incrivelmente impressionante”, diz.
Com a transformação do time em Audi em 2026, os objetivos também crescerão, bem como a pressão sobre os pilotos. Além disso, haverá uma mudança brusca de regulamento, e o time espera iniciar sua jornada como time oficial de F1 de forma competitiva já no primeiro ano. Wheatley conta que a expectativa é contar com o talento de Bortoleto para progredir ainda mais rápido em 2026.
“Se você olhar a carreira dele, ele tem sido incrivelmente ligado aos times que ele está, até mesmo as equipes de kart que ele está. Ele poderia ter pulado para se colocar em uma posição melhor, mas construiu um time em torno dele, e eu acredito que ele se tornou parte desse time. O trabalho do Mattia e o meu é dar o melhor equipamento e a melhor atmosfera para ele, para ele sentir que este é o seu time. E este time estará ao redor dele, dando apoio. E se nós criarmos esse ambiente, ele ficará”, diz Wheatley.
Com sete etapas para o final de 2025, Bortoleto já terá motivos de sobra para fazer seu ano de estreia na F1 como algo especial. Mas, como piloto de fábrica a partir de 2026, seu status também mudará no paddock, com mais pressão, certamente, mas também com potencial de seguir surpreendendo àqueles que duvidaram de seu potencial na véspera do GP da Austrália deste ano.
Folha de S.Paulo