O Pico Paraná, cume mais alto do sul do país, com seus 1.877 metros de altitude, e um dos maiores atrativos do montanhismo na região, localizado no parque estadual que leva seu nome, acaba de ganhar um plano de manejo para seu entorno, o Plano de Uso Público Emergencial, elaborado pelo IAT (Instituto Água e Terra), com apoio técnico e financeiro do Programa Biodiversidade Litoral do Paraná. O texto estabelece, por primeira vez, diretrizes para ordenar o uso público do parque, incluindo regras para pernoite, acesso controlado, manejo de trilhas e participação comunitária.
A decisão de botar ordem no pedaço veio a partir da constatação de que, com uma visitação crescente de um número cada vez maior de pessoas interessadas nas trilhas e pirambeiras da área, e o aumento de notícias de resgates, era fundamental regulamentar a bagunça.
“A questão da segurança é um dos desafios que o uso público busca solucionar, já que a região do pico Paraná apresenta alto nível de dificuldade e riscos de acidente”, explica Marina Rampim, bióloga e chefe do Parque Estadual Pico Paraná.
“Atualmente, há uma mudança no perfil dos visitantes”, acrescenta, “que antes era composto majoritariamente por praticantes de atividades em montanhas e afins, mas que agora tem diferentes perfis”.
Embora a gestão garanta que o acesso ao parque não vai ser cobrado, nem alvo de concessão, Marina conta que, para garantir que as regras de segurança sejam seguidas, o plano é buscar “parcerias com propriedades privadas onde ficam os acessos secundários”. A ideia é garantir que todos os prestadores de serviços turísticos da região assegurem o cumprimento de exigências básicas, como portar lanternas e roupas adequadas para o terreno e o clima.
“Também está previsto um trabalho de orientação mais efetiva, já que muitos visitantes chegam sem buscar informações prévias sobre as trilhas ou o nível de dificuldade”, afirma a bióloga. “A intenção é que todos acessem o parque bem informados e preparados para os desafios que encontrarão”.
As ações previstas para o parque incluem a obrigatoriedade de o visitante fazer um cadastro online, assinando um termo de ciência dos riscos, além da criação de um sistema de reservas para acampamento em locais previamente autorizados. De acordo com a política de mínimo impacto, ficam proibidas fogueiras, e será obrigatório o uso de recipientes para dejetos pessoais (o famoso shit tube) para quem pernoitar na área, bem como o descarte de lixo em locais previamente designados. As barracas deverão exibir placas com os números de identificação da reserva, para facilitar a fiscalização.
Fisicamente, haverá padronização da sinalização das trilhas, além da instalação de escadas-grampo em trechos mais perigosos. E áreas degradadas poderão ser fechadas temporariamente para recuperação ambiental.
A execução do plano está sendo financiada pelo Programa Biodiversidade Litoral do Paraná (BLP), criado como compensação ambiental pelo vazamento de óleo da Petrobras em 2001. Com aporte de R$ 110 milhões ao longo de 10 anos, o BLP é considerado uma das maiores iniciativas de conservação da Mata Atlântica em andamento no Brasil.
Entre 2021 e 2023, o número de visitantes nas unidades de conservação paranaenses cresceu 184%, saltando de 192 mil para mais de 545 mil pessoas, segundo dados do IAT. O Parque Estadual Pico Paraná é responsável por boa parte dessa procura. Além do desafio do cume, a unidade de conservação é um dos principais pontos de partida para trilhas icônicas como Itapiroca, Caratuva e Camapuã. Dados de 2024 mostram que em junho, considerado mês de alta temporada, mais de 3.500 pessoas passaram só pela trilha do setor Caratuva —embora sensores instalados pelo IAT apontem que mais da metade da visitação ocorre sem registro. E, consequentemente, sem controle.
Para a implementação do plano, foi criado um conselho consultivo e um programa de voluntariado para o monitoramento das trilhas. A expectativa é de que a experiência sirva como base para um futuro plano de manejo definitivo da unidade, com participação de organizações como a Fepam (Federação Paranaense de Montanhismo), criada em 2002 e filiada à Confederação Brasileira de Montanhismo e Escalada.
“Teremos que unir esforços para executá-lo. Muitas mudanças exigirão tempo e adaptação por parte dos visitantes. Mas é uma transformação necessária para garantir a proteção do parque e das montanhas que fazem parte da nossa identidade”, diz Marina.
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Folha de S.Paulo