A final da Copa Rio entre Portuguesa-RJ e America-RJ, vencida pela equipe da Ilha do Governador, na zona norte do Rio de Janeiro, no último sábado (20), passaria despercebida por muitos se não fosse por um elemento tão decisivo quanto inusitado fora das quatro linhas: uma pizza portuguesa.
Tudo começou após a primeira partida, disputada uma semana antes. Torcedores do America, time presidido pelo ex-atacante e atual senador Romário, ainda eufóricos pela vitória por 1 a 0, debocharam do rival com o coro “Portuguesa é pizza”. O rival não digeriu bem a zombaria e tramou um saboroso troco.
Uma semana depois, o presidente da Portuguesa carioca, Marcelo Barros, entrou no vestiário com uma caixa de pizza nas mãos para transformar a provocação em motivação. A cena do discurso acalorado viralizou nas redes sociais.
“Quem filmou a preleção foi uma estagiária do nosso departamento de comunicação, o assessor não estava. Eu não sabia, não foi nada combinado. Falei muito palavrão, poderia ter evitado, mas o momento pedia um algo a mais para levantar o moral do grupo de jogadores”, conta Barros à Folha.
“A gente sempre come pizzas depois, por conta ser uma boa fonte de carboidratos para repor a energia dos atletas, mas eu falei para o meu parceiro que produz: ‘desta vez eu quero antes’. Ele perguntou por várias vezes se tinha necessidade mesmo, disse que sim”, completou o cartola, que chegou a usar metáforas como “amassar o adversário” enquanto amassava um pedaço de pizza.
Curiosamente, a pizza da discórdia –sabor portuguesa–, que leva ingredientes como presunto, ovos, cebola e azeitona, nasceu em São Paulo na década de 1960, e não em Portugal.
Criada em uma cantina paulistana, recebeu o nome em homenagem aos imigrantes portugueses que frequentavam o local e pediram para incluir ovos e outros itens típicos da culinária lusa na cobertura.
A operação para que a pizza estivesse nas mãos do dirigente antes do início do jogo, às 18h, mexeu com a programação do fornecedor, que precisou adaptar o horário de funcionamento do estabelecimento para atender ao pedido inusitado.
Segundo Barros, a primeira decisão foi marcada por provocações. “No jogo de ida, fomos hostilizados. Atiraram copos nos atletas e na comissão técnica. E, durante a semana, teve gente ligada ao America postando foto comendo pizza, torcida provocando… aí eu pensei: vamos transformar isso em combustível.”
O clima tenso entre as equipes também foi acentuado nos bastidores. O regulamento prevê ao campeão do torneio o direito de disputar a Série D do Brasileiro do ano seguinte, enquanto o vice vai para a Copa do Brasil. Mas um acordo amigável entre as agremiações poderia mudar a definição das vagas.
Como ambos queriam jogar a Série D, a rivalidade só aumentou. “Falei com o Romário antes do primeiro jogo. Ele disse, na resenha, que queria a Série D tanto quanto eu. Então tudo ganhou maior proporção”, relata.
O desfecho veio dentro de campo. A Portuguesa venceu a partida decisiva por 2 a 0, no estádio Luso-Brasileiro, e levantou a taça da Copa Rio, com direito a comemoração farta: “geralmente são 12 pizzas, mas pedi três vezes mais para depois da final já confiando no resultado. Acabou virando um rodízio para jogadores, comissão e torcida”.
Para o dirigente, que preside o clube desde 2020 e é filho de João Rêgo, presidente de honra da Portuguesa, o título tem um peso simbólico para a história centenária da agremiação.
“Somos muito bairristas, são 300 mil moradores aqui na Ilha. É a sensação de pertencimento. A Portuguesa carrega a bandeira da Ilha”, explica.
Ao final do jogo, funcionários do clube serviram pizza aos jogadores ainda no gramado, enquanto torcedores responderam às provocações levando caixas para as arquibancadas.
Um princípio de confusão foi rapidamente contido após um homem, trajando a camisa da Portuguesa, oferecer pizza a funcionários do America.
Este foi o quarto título da Copa Rio pela Portuguesa –campeã em 2000, 2016, 2023 e 2025. Já o America-RJ voltará a disputar uma competição nacional depois de 15 anos.
Folha de S.Paulo