Na grande reforma realizada na matriz do Santíssimo Sacramento de Cantagalo nos anos de 1950 a 1952, sob o comando do dinâmico Padre Crescêncio Lanciotti, que durante 43 anos foi o nosso diretor espiritual, o interior do templo foi totalmente modificado; os dois púlpitos laterais e as cercas de madeira de lei que circundavam os altares laterais foram retirados, o mesmo acontecendo com dois lustres de cristais que pendiam do teto. O assoalho de madeira deu lugar a um piso de mármore, enquanto nas paredes e no teto foram pintadas oito belíssimas telas sacras.
Na época, nosso vigário anunciou que um pintor italiano que havia pintado a Catedral de Bolonha viria pintar nossa igreja. Eu, com meus 15 anos de idade, coloquei em dúvida tal declaração, embora fosse amigo e admirador do sacerdote nascido em Subiaco, na distante Itália, mas era verdade. Um dia Antônio Maria Nardi chegou a Cantagalo e passou a trabalhar intensamente, morando no próprio prédio da igreja, deixando eternizado nas paredes e no teto seu extraordinário trabalho artístico .
Suponho que o Padre Crescêncio tenha conhecido o artista Nardi na cidade paulista de Serra Negra, onde nosso vigário gostava de passar alguns dias recuperando as suas energias e o pintor realizara diversos trabalhos na igreja daquele município.
Naquele tempo os andaimes eram de madeira, nas pinturas do teto o pintor permanecia deitado enquanto trabalhava e o Padre Crescêncio subia até o alto para ver o trabalho de perto. Tenho uma foto de um desses momentos.
Na parede posterior ao altar principal existem dois quadros de momentos importantíssimos do catolicismo. O mais alto representa Jesus crucificado, ladeado por Maria Santíssima e pelo apóstolo João. Mais abaixo, a última ceia, em que Jesus instituiu a Eucaristia: “Isto é o meu corpo, que é dado por vós. Fazei isto em memória de mim”.
Entrando pela porta principal da igreja, do lado direito, foi pintado o milagre de Santo Antônio, em que a mula faminta, sem comida há três dias, solta na praça principal da cidade, com um cocho de capim de um lado e Santo Antônio em oração com a Eucaristia do outro lado. O animal corre e se ajoelha diante da hóstia consagrada, deixando de lado os vegetais oferecidos pelo deu proprietário, embora faminta. Milagre que converteu o dono do animal e outras pessoas que não acreditavam na presença de Jesus na Eucaristia.
Defronte, na parede à esquerda outro quadro revelador de mais um milagre Eucarístico. No momento em que os mulçumanos se preparavam para invadir o convento em que Santa Clara era a superiora, ela determina que todas as freiras permanecessem em oração, enquanto ela, corajosamente, abre a porta do convento e apresenta o ostensório com a Eucaristia. Os mulçumanos que se encontravam mais à frente caem fulminados, enquanto os demais fogem temerosos.
Convém lembrar que os mulçumanos fanáticos que invadiram a Europa, destruíam tudo que pertencesse ao catolicismo, prendiam as freiras que, posteriormente, eram estupradas.
Mais adiante, próximo ao meio da igreja, estão pintados dois anjos que trabalham no campo. O da direita colhe o trigo, que será transformado em pão, enquanto o da esquerda recolhe os cachos de uva, que depois de pisadas e fermentadas, darão o vinho.
A nossa fé ensina que pão e vinho depois de consagrados durante as missas serão transubstanciados em Corpo e Sangue de Jesus, a Eucaristia, centro de convergência da fé católica no mundo inteiro, desde a mais simples capela de um povoado até as grandes catedrais construídas pela humanidade. “Eis o milagre da nossa fé”
No teto da igreja, Nardi nos deixou mais duas telas ligadas à Eucaristia; numa aparece o Cordeiro de Deus sobre um livro, sendo adorado pelos anjos. Na outra, um anjo eleva o ostensório com a Eucaristia, que é adorada por diversos anjos.
Além dessas telas, Nardi desenhou mais duas passagens bíblicas que outro artista, Zucca, transformou em vitrais. Junto a pia batismal é o batismo de Jesus Cristo por João Batista, nas águas do Rio Jordão. Próximo à escada que dá acesso ao coro a Assunção de Maria Santíssima.
Há cerca de dez anos que todo esse trabalho foi restaurado por um artista do Rio de Janeiro. Trabalho que ficou caríssimo, sendo as telas protegidas por um verniz.
Além de honra à Eucaristia e estímulo a nossa fé, esse extraordinário trabalho de Antônio Maria Nardi, deveria ser utilizado pelo turismo, como ocorre em tantas cidades. Certa vez, quando visitava algumas cidades do interior de São Paulo, pela extinta Soletur, fui levado a um templo católico para ver as pinturas de um artista, não me lembro se foi Bauru ou Itu, entrada paga e um grande decepção as pinturas estavam em péssimo estado necessitando uma restauração urgente.
As do nosso Santuário Eucarístico estão em perfeito estado, graças ao cuidado dos vigários que por aqui passaram e a colaboração dos fiéis.
Jornal da Região
