MPF defende gestão costeira integrada em audiência pública que debateu legislação sobre acesso às praias – Notícias das Praias


 

Projeto de lei em discussão deve estar de acordo com as normas e princípios constitucionais, destaca procuradora regional

 

O gerenciamento costeiro é um assunto nacional, que exige a atuação integrada dos três entes da Federação (União, estados e municípios). O projeto de lei que busca garantir o acesso público às praias não pode reduzir a proteção legal desses locais, nem excluir a União do processo de gestão dos espaços, sob pena de ferir a Constituição. Esses foram os principais pontos destacados pelo Ministério Público Federal (MPF) em audiência pública realizada pelo Senado na última terça-feira (1º), para discutir o Projeto de Lei n° 755/2022.

 

Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

A procuradora regional da República Gisele Porto, coordenadora do Grupo de Trabalho Zona Costeira da Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF (4CCR), afirmou que é louvável a iniciativa de criar instrumentos para ampliar a efetividade do direito de acesso às praias previsto na legislação vigente, e ressaltou que o legislador deve atentar para que as novas regras propostas não representem retrocesso ou infração a princípios constitucionais. Parabenizou, ainda, a iniciativa de ouvir setores técnicos, jurídicos e sociais sobre o texto.

O PL 775/2022 foi apresentado em resposta à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022, conhecida como PEC das Praias, que prevê a transferência de terrenos de marinha a particulares, a estados ou a municípios, para mostrar que não há a intenção de limitar o acesso às praias. Embora as praias sejam bens da União, segundo a Constituição, com entrada livre e gratuita prevista em lei, o acesso é impedido ou limitado por condomínios e construções à beira mar em muitos pontos do litoral. Na tentativa de equacionar o problema, o PL propõe alterações em normas como a Lei de Gerenciamento Costeiro (Lei n° 7.661/1988) e o Estatuto das Cidades (Lei n° 10.257/2001).

No encontro, a procuradora regional lembrou que a Lei n° 7.661/1988 criou o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC), que prevê a atuação integrada dos entes federativos na gestão do litoral, com a criação de planos federal, estaduais e municipais, prevalecendo sempre a regra mais restritiva (ou seja, de maior proteção). A norma estabelece, ainda, que o acesso às praias só pode ser limitado em trechos considerados de segurança nacional ou por áreas de proteção criadas por lei específica.

Já o PL 755/2022 prevê a possibilidade de restrição em caso de criação de Unidades de Conservação, que não exigem edição de lei e podem ser instituídas por ato do Poder Público. Com isso, a proposta amplia as possibilidades de limitação do acesso às praias. “É possível criar uma unidade de conservação que permita uma propriedade privada em seu interior, como é o caso do Monumento Natural, por exemplo, estabelecendo nichos de propriedade privada nas praias”, explicou a procuradora. Se aprovada com esta modificação na legislação atual, a medida vai significar menor proteção e violação ao princípio do não retrocesso ambiental.

Ela também destacou que a Constituição fixa que todas as praias marítimas, urbanizadas ou não, pertencem à União. O ente federativo deve coordenar os atos de transferência de gestão de seus bens. Ao passar para os municípios aspectos da gestão das praias urbanas diretamente, o PL limita o direito da União de administrar o próprio patrimônio, o que vai contra a Carta Magna. “A União deve sempre avaliar a possibilidade de transferência da gestão das praias e capacitar os municípios que a recebem, para assegurar o melhor gerenciamento costeiro”, reforçou Gisele.

Ela enfatizou também que a elaboração do Planejamento Espacial Marinho (PEM), instrumento que busca ordenar o uso e exploração de espaços marinhas, tem ligação direta com os espaços em terra, o que é outro motivo que impede a privatização das praias especialmente acarretada por escolhas da gestão municipal .

MPF Gerco

 

 

Atuação – O MPF atua na temática desde 2015, com a criação do Projeto MPF Gerenciamento Costeiro (MPF Gerco). A iniciativa acompanha a transferência da gestão de praias da União para os municípios, prevista na Lei 13.240/15. Pela regra, esse repasse não é automático e deve ser analisado caso a caso. Se o município figurar como réu num processo que trata da limitação de acesso à praia, por exemplo, a transferência não pode ser efetivada.

“O MPF atua como órgão articulador do contato entre esferas federal, estadual e municipal, para que a gestão seja transferida de forma benéfica para o meio ambiente e para a sociedade como um todo. O objetivo é esclarecer as prefeituras para prevenir impactos negativos causados pela falta de informação sobre os aspectos que envolvem a gestão das praias”, explica a procuradora regional. Apenas em 2025, sete oficinas com gestores municipais já foram realizadas nas sedes do MPF em capitais costeiras brasileiras, para capacitar os gestores e dialogar sobre os vários aspectos da questão.



Notícias das Praias