Só os mais velhos vão lembrar de um adesivo que alguns pais colavam nos carros, que dizia: “Quer conhecer a vida selvagem? Tenha filhos”. Estamos falando aqui da pré-historia anterior às redes sociais, claro. Mas quem já teve que improvisar malabares para tentar entreter as crias nas férias dentro de um apartamento vai entender. Ou talvez nem tanto, já que esses serzinhos andam preferindo ficar grudados em uma tela a sair por aí batendo perna. Mas vamos falar daquela hora em que resolvemos arrancar as pessoinhas do sofá e levar para o mato, talvez até a montanha. Dá para conciliar?
O montanhista Alexandre Gazinhato, conhecido como Francês, conta que leva o pequeno Bento, de um ano e dez meses, para trilhas e montanhas “desde os 3 meses”. O menino, que tem todo o equipamento de um adulto —capacete, roupas de manga longa e óculos de proteção—, vai numa cadeirinha na mochila do pai e, em casa, já ganhou uma parede de escalada apropriada para seu desenvolvimento.
“Só o levamos a ambientes que conhecemos”, explica Francês, “pois não dá para ir na incerteza, o planejamento tem que ser melhor quando você está com uma criança, você não vai assumir os mesmos riscos”. Ele recomenda que “todo mundo leve o filho para o ambiente natural, para a montanha, pois quando a criança cresce e viveu no verde, ela tem a sensação de que é uma área segura, de conforto, e se isso acontecer até os cinco anos de idade, vai ter isso para sempre em sua vida”.
Do ponto de vista médico, o pediatra, hebiatra e montanhista Rodrigo Rodriguez, do hospital Sabará em São Paulo, diz que a priori não há contraindicação de atividades no mato ou na montanha para nenhuma idade. Mas alerta para alguns cuidados essenciais que vão desde garantir que a cobertura vacinal esteja completa e a criança consiga comer todos os alimentos, em geral a partir de um ano de idade, até assegurar “cuidado redobrado na qualidade da água, com tratamento completo sempre”.
“Crianças que usam fórmulas lácteas precisam de cuidado extra, pois elas estragam muito rapidamente”, acrescenta o médico. “E no caso das mochilas, a maioria tem a faixa de idade apropriada para a idade e o peso da criança indicada pelo fabricante”. Viagens de longa distância e de alta intensidade para adolescentes, recomenda, demandam uma avaliação cardiológica antes de botar o pé na estrada.
Para o também pediatra que um dia largou a carreira para viver nas montanhas Manoel Morgado, e que se especializou em levar grupos a destinos desafiadores como o Kilimanjaro, o Aconcágua e o trekking até o acampamento-base do Everest, criança menor de 13 anos não entra em suas expedições. “A dinâmica do grupo teria que mudar no caso de crianças pequenas”, explica. Já para adolescentes acima dessa idade, ele conta que tem sido frequente a procura por parte de famílias inteiras que querem viver essas experiências juntos. “O único problema com eles é que, por serem muito fortes e vigorosos, querem andar mais depressa, chegar logo, e precisamos segurá-los para assegurar a aclimatação de todo o grupo”, diz.
O guia especializado em altas montanhas Pedro Hauck, que só admite em suas jornadas maiores de 13 anos acompanhados dos pais, ressalta que a (Uiaa) União Internacional das Associações de Alpinismo recomenda claramente não levar menores de 8 anos para as escaladas da vida. “Já levei um adolescente de 15 anos ao cume do Licancabur, com 5.900 metros de altitude, mas a exigência tem que ser estar bem crescido e saudável, porque o montanhismo é exigente”, completa.
E é a partir de 8 anos que Magno Souza, especialista em roteiros amazônicos e subidas ao icônico monte Roraima e ao pico da Neblina, aceita seus clientes. “Já levamos crianças para o monte Roraima e o primeiro que buscamos saber é se a criança é ativa, gosta de atividades na natureza, se têm alguma experiência em acampamento, e entrevistamos os pais para identificar se estão cientes dos cuidados específico”atenções diferentes das dos adultos numa expedição”, afirma.
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Folha de S.Paulo