Avaliação: novo Macan elétrico é a grande aposta da Porsche


Reportagem Gian Luca Pellegrini
Tradução e Edição Flávio Silveira

Há certos modelos que representam uma mudança de paradigma em uma empresa, estabelecendo um antes e um depois. O Mercedes 190 fez esse papel no início da década de 1980, marcando a estreia no mercado de massa de um fabricante até então de luxo, e introduzindo uma solução técnica – o eixo traseiro multilink com cinco braços – destinada a se tornar padrão do segmento. Assim foram, entre as décadas de 70 e 80, os casos dos Fiat Panda e Uno, do Nissan Qashqai, do Audi Quattro e do primeiro Range Rover. Nascidos de uma brilhante intuição, derrubaram princípios de engenharia das marcas e abriram oportunidades de negócios.

Na Porsche, tal catarse coincidiu com a estreia do Cayenne: em 2002, a marca que se tornara lendária por sua sólida lealdade ao clássico 911 apresentou um carro que, para os entusiastas, era a antítese do puro desempenho. Vinte e dois anos depois, reforma semelhante é sentida novamente na Alemanha: o Macanapós dez anos de vida, se torna totalmente elétrico.

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A Porsche entrou no mundo de emissão zero (de escape) faz tempo.
• Mas uma coisa é oferecer o Panamera a gasolina e um sedã elétrico de porte e preço similares, o excelente Taycan: uma estratégia cautelosa, seguida por quase todos.
• Outra é decidir que o modelo mais vendido da gama deixará de ter opção a combustão, mesmo que híbrida plug-in. Felizmente, a escolha draconiana é principalmente europeia. No resto do mundo, com o Brasil incluso, os dois Macan coexistirão.

O que enterrou as possibilidades de sobrevivência da versão do ciclo Otto na Europa foram os novos regulamentos de segurança digital: seria complexo e caro adaptar o Macan atual. Então, a Porsche decidiu fazer da necessidade uma virtude e cruzar a ponte sem volta, sem arrependimentos (espero), convencida de que é a única maneira de acelerar a transição inevitável.

Então, aqui estamos nós, ao volante do novo Macan, tentando imaginar como o cliente da Porsche irá receber a transformação.
• Não vou me perder em considerações sobre a estética.
 Se a motorização foi alvo de uma revolução, as linhas e proporções (exceto o entre-eixos bem maior) continuam iguais.
• Talvez seja para não desorientar de vez o já perplexo cliente.
• O mesmo vale pro interior: o layout muda, mas o ambiente é inquestionavelmente Porsche, com displays abundantes (o da frente do passageiro é opcional).

(Divulgação)
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A cabine é tipicamente da Porsche, com tela opcional para o passageiro. Acima, o tradicional e bem localizado seletor de modo de condução. Ao alto, o controle de volume (é um dos raros comandos físicos) e a inusitada alavanca de câmbio, “encaixada” entre volante e tela central

O Macan é o primeiro carro a adotar a nova plataforma PPE de 800 volts.
• Isto significa mais eficiência e carregamento mais rápido: a capacidade efetiva do conjunto é de 95 kWh, com carga de até 270 kW (mas em casa, só 11 kW AC).
 As duas versões disponíveis – o Macan 4 e Macan Turbo (que não é turboalimentado, mas mantém a nomenclatura contraditória) – compartilham bateria e configuração bimotor (e tração integral). Devo dizer que o 4 é menos mau, em desempenho longitudinal, do que eu esperava.
 Já o Turbo acelera de 0-100 km/h em 3,3 segundos, o que diz muito sobre a forma como coloca os 584 cv e mais de 1000 Nm (100 kgfm) no chão.
• O que surpreende não é a caixa de velocidades de uma velocidade (o Taycan tem duas), mas a decisão de não usar aletas no volante para ajustar a recuperação de energia (e, portanto, o freio motor).

Ao volante

Ao entrar no novo Macan, ainda com o SUV parado, vejo que, nos pontos que importam para contribuir com o prazer ao volante – posição de guiar, distância entre volante e pedais, visibilidade, etc. –, é difícil achar falhas.

Mas vamos à dirigibilidade, o que de fato importa em um Porsche (e num mundo de elétricos onde o enorme Kia EV9 vai a 100 km/h em cinco segundos e desempenho forte não é exclusivo dos esportivos).

• Dirigir as duas versões na sequência ajudou a destacar as diferenças.
 A opção Macan 4, com o pacote básico, é silenciosa (se desejar, tem som artificial) e rápida, mas sem ser extrema.
 Já o Turbo – especialmente com todos os opcionais dinâmicos, de vetorização de torque plus a eixo traseiro direcional, passando pela suspensão a ar – é completamente diferente.
• É ao volante do Turbo que não tem nada de turbinado que se aprecia verdadeiramente o trabalho dos engenheiros para fazer desaparecer, com o ajuste da direção e das suspensões, um peso que não é exatamente baixo (mais de 2,4 toneladas).

Mas o Macan elétrico é um Porsche de verdade? Ele é maior (tem dois porta-malas), mais confortável e silencioso do que a opção com motor a combustão, e um pouco mais rápido, mas a questão é se a experiência ao volante atende às tradições da marca. E a impressão, mais pronunciada ao volante do “Turbo”, é que a marca realizou um trabalho árduo pra não fazer o motorista “normal” perceber as consequências das transferências de massa e carga, conseguindo um equilíbrio dinâmico que honra a fama do fabricante.

O problema (comum a todos os esportivos a bateria) é que a diversão – assumindo que seja esse o motivo da compra – sempre vai durar pouco. Sua autonomia – de uns 600 quilômetros no generoso ciclo WLTP, o que significa cerca de 400 “reais” – desaparece quando se coloca a cavalaria à prova ou se mantém altas médias nas rodovias (maiores inimigas dos BEVs) por muito tempo.

Será esse um limite que pode acabar empurrando os entusiastas da Porsche para outras marcas menos sensíveis à sustentabilidade, seja ela real ou presumida? A marca não parece preocupada com isso, e diz ter certeza de que o Macan é excelente e perfeitamente alinhado com as expectativas dos fãs. Não duvidamos.

Restam as questões da usabilidade e da inclinação do consumidor a aceitar os limites funcionais e os problemas do universo de carregamento dos elétricos, que independem do preço e do posicionamento.

Uma base totalmente nova

Plataforma Elétrica Premium (PPE) estreia no Porsche Macan e tem como destaque a configuração de 800 volts.

• O SUV pode ser carregado de 10 a 80% em 21 minutos a 270 kW. Nas estações de 400 volts, a potência cai à metade, e a mesma recarga requer 33 minutos.

• recuperação de energia pode chegar a 240 kW quando os dois motores síncronos trifásicos com ímãs permanentes agem como geradores.

• A maior diferença entre o Macan 4 e o Macan Turbo aparecem na potência: 387 cv, ou 408 com overboost, no primeiro, e 584 cv, com 639 de pico, no segundo.

• Os freios também mudam: os dianteiros são de 350 mm com pinças de quatro pistões no 4, e de 400 mm e seis pistões no Turbo (na traseira, sempre têm 350 mm).

• As suspensões são a ar, com amortecedores eletrônicos no Turbo, enquanto o 4 tem molas clássicas e, opcionalmente, amortecedores inteligentes com calibração dupla (rebote e compressão).

• Os modos de condução também definem esterçamento do eixo traseiro (até 5°) e a aerodinâmica ativa, com spoiler ajustável e Cx de 0,25.

Porsche Macan Turbo

Preço na Europa R$ 670.000
Preço estimado no Brasil  R$ 750.000

Motores: elétricos, um por eixo, síncronos, ímãs permanentes
Combustível: eletricidade
Potência combinada: 584 cv (430 kW) ou 639 cv com overboost
Torque: 1130 Nm (overboost)
Câmbio: automático, caixa redutora com relação fixa
Direção: elétrica
Suspensões: braços duplos (d) e multilink (t)
Freios: discos ventilados (d) e discos sólidos (t)
Tração: integral, opção de diferencial eletrônico autoblocante
Dimensões: 4,78 m (c), 1,94 m (l), 1,62 m (a)
Entre-eixos: 2,89 m
Pneus: n/d
Porta-malas: n/d
Bateria: íons de lítio, 100 kWh
Peso: 2.405 kg
0-100 km/h: 3,3 segundos
Velocidade máxima: 260 km/h (limitada)
Consumo médio: 5,1 km/kWh (Europa)
Autonomia: 518 quilômetros (Europa)
Recarga máxima: 11 kW AC e 270 kW DC



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