Perfis falsos fazem as vítimas se apaixonarem, para cometer o crime de estelionato sentimental virtual. Golpe é aplicado por grupos internacionais. Saiba o que fazer se o seu namorado virtual pediu dinheiro e sumiu
Vitoria Romero Coelho
Quatro em cada dez mulheres já foram vítimas de golpes de romance online ou conhecem alguém que foi, aponta pesquisa obtida exclusivamente pelo g1 da organização “Era Golpe, Não Amor”, uma parceria da empresa Hibou, da Associação Brasileira de EMDR e o Ministério Público de São Paulo.
Um desses golpes é o “romance scammer” ou estelionato sentimental virtual. Nele, grupos de estelionatários estrangeiros se aproximam das vítimas pelas redes sociais, fazem com que se apaixonem e pedem dinheiro emprestado – o valor nunca é devolvido.
Por ser um crime em escala internacional, é difícil para a vítima conseguir recuperar o dinheiro roubado, mas existem algumas dicas que podem auxiliar no processo. Veja a seguir.
O que fazer se for vítima
Para denunciar, é preciso:
salvar as conversas, principalmente, aquelas em que há o pedido de dinheiro;
guardar os comprovantes de pagamentos e dados bancários de quem recebeu;
não apagar fotos que o bandido enviou;
fazer um boletim de ocorrência relatando tudo o que aconteceu;
contratar um advogado, para ter auxílio em cada etapa, uma vez que se trata de um crime mais complexo.
O que diz a lei
O estelionato é um crime tipificado no artigo 171 do Código Penal. É considerado estelionato sentimental quando o relacionamento é usado para extorquir dinheiro da vítima.
O artigo diz ainda que: “A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se a fraude é cometida com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro por meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico fraudulento, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo”.
Por ter um princípio semelhante, o “romance scammer” também pode ser enquadrado nesta lei. Mas, por envolver quadrilhas internacionais, fica mais complicado punir o acusado. Primeiramente, porque, muitas vezes, a vítima não sabe a identidade real da pessoa com quem tem conversado.
Mas punir o crime somente como estelionato sentimental não é suficiente, afirma Glauce Lima, caçadora de golpistas e fundadora do Instituto GKScanOnline, de apoio a vítimas de crimes cibernéticos.
Ela começou a procurar os bandidos online após uma amiga ser vítima do golpe em 2011. Em 1 ano, ela conseguiu remover 1.600 perfis falsos de rede social e em 2013 conseguiu prender o golpista que roubou sua amiga, em parceria com a polícia nigeriana, onde vivia o bandido.
“Ele não é só estelionato, ele é uma formação de quadrilha. O dinheiro do “romance scammer”, a gente tem prova que ele acaba sendo desviado para o tráfico internacional de drogas”, diz.
Por isso, para ter alguma chance de encontrar os bandidos, é necessário que a Polícia Federal auxilie nos procedimentos e identifique em qual país está o bandido. Isso pode ser feito rastreando o IP, que é o número identificador do computador, ou ainda refazendo o caminho do dinheiro das vítimas até o grupo golpista.
Quando a vítima é mulher, simular um relacionamento para obter vantagens financeiras também pode ser considerado uma violência doméstica financeira e, portanto, ser enquadrado na lei Maria da Penha, explica o promotor Thiago Pieronom do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDF).
Caso o estelionatário possa ser identificado, a vítima pode receber indenização também por danos morais e materiais.
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Vergonha de denunciar
As vítimas do “romance scammer” têm dificuldades para denunciar. Primeiramente, elas sentem vergonha do que a família irá pensar.
“O segundo obstáculo que a vítima enfrenta é que, muitas vezes, ela começou a mexer no patrimônio da família sem os outros saberem. Então, se ela for denunciar, vai ser exposta”, conta Glauce.
Foi o que aconteceu com Isabela*, que vendeu um terreno que havia recebido de herança da sua mãe para enviar para o golpista e nunca contou para o seu marido, por medo da reação dele.
Além disso, há o julgamento da sociedade de que quem cai nesse golpe são pessoas “burras”, causando mais vergonha, aponta Desiree Hamuche Montes, fundadora da iniciativa “Era Golpe, Não Amor”.
Como evitar ser vítima
Nunca envie dinheiro para quem você não conhece pessoalmente e se certifique de que está falando com a pessoa que você pensa estar conversando;
Consulte o CPF e caso apareça algum processo, tente entender do que se trata;
Dê o máximo de informações erradas da sua vida, por exemplo, informe um salário baixo, não conte nada sobre a sua família;
Evite adicionar quem você não conhece no Facebook;
Se quiser enviar nudes, não faça fotos em que é possível te identificar, porque o bandido pode usar para chantagear;
Não peça para que o golpista “prove que é a pessoa de verdade”. Ele irá arranjar uma forma de fazer isso, ainda que com deepfake, tecnologia que permite mostrar o rosto de uma pessoa em fotos ou vídeos alterados com ajuda de inteligência artificial (IA);
Desconfie se você não pode apresentá-lo para amigos e familiares.
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*Isabela é um nome fictício, para proteger a vítima.
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