Iane Filgueiras tinha 13 anos quando devorou em três dias as 700 páginas do livro Harry Potter e a Ordem da Fênix, o quinto de sete volumes da saga escrita pela britânica J. K. Rowling. “Eu gostava de ler, mas nunca tinha lido algo tão grande”, diz a jornalista. “Me incentivou bastante a não ter medo de livros grandes.”
Hoje, com 30 anos, Iane faz parte da geração que cresceu junto com o bruxo, que a cada livro tinha um ano a mais, e que, junto com ele, tomou gosto pela leitura. “A minha mãe chegou a falar que ia me proibir de ler, porque eu ia tomar banho e levava o livro, eu estava comendo e lia o livro, precisava saber o que ia acontecer.”
Em abril, Harry Potter completou 20 anos no Brasil, contados desde que os livros foram traduzidos e chegaram às livrarias nacionais. Atualmente, o país é o sétimo mercado de livros do bruxo, com mais de 5 milhões de cópias vendidas. Em todo o mundo são 450 milhões de livros vendidos. Ao todo, Harry Potter foi traduzido para mais de 70 idiomas.
Os livros contam a história de um menino que, aos 11 anos, recebe uma carta para estudar na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Harry, que vive com os tios, descobre, então, um mundo que, por magia, se sobrepõe e se esconde em meio às ruelas, esquinas e bairros do mundo dos não bruxos, os chamados trouxas. Descobre também que é uma criança famosa e o único capaz de derrotar o poderoso bruxo Voldemort, que ameaça a paz entre os dois mundos.
Os sete livros foram originalmente lançados entre 1997 e 2007, no Reino Unido. No Brasil, chegaram a partir de 2000, publicados pela editora Rocco. Em 2001, os primeiros volumes traduzidos chegaram às mãos de Iane, que tinha, na época, 10 anos. “Estava prestes a fazer 11 anos e fiquei naquela expectativa da chegada da minha carta para Hogwarts. Só que não chegou”, brinca.
Marco na literatura
“Harry Potter é um marco para a literatura juvenil no mundo, não só para a literatura brasileira, é um divisor de águas”, diz o diretor de Marketing da Rocco, Bruno Zolotar. “A leitura do público infantojuvenil era, até então, muito do que a escola indicava, do que tinha nas bibliotecas. Harry Potter foi um marco porque não foi a mãe que mandou ler ou a escola. Os jovens tiveram interesse por essa história. Não só aqui no Brasil, mas no mundo, muita gente entrou na leitura e desenvolveu hábito de leitura através de Harry Potter”. A editora lançou, em comemoração ao aniversário, novas edições de capa dura e box especial para os fãs colecionadores.
Além da literatura, a criação de J. K. Rowling ganhou as telas do cinema, virou parque temático nos Estados Unidos e transformou-se em milhares de brinquedos, roupas, acessórios e souvenirs. A franquia Harry Potter como um todo é estimada em aproximadamente US$ 25 bilhões.
O universo de Harry Potter invadiu até mesmo a política brasileira. Em 2016, o Brasil passava por um processo de impeachment presidencial. Entre o discurso de despedida da presidente afastada Dilma Rousseff e a posse do, então, presidente interino, Michel Temer, surgiu nas redes sociais um novo nome para disputar a faixa presidencial brasileira: o bruxo Dumbledore. No dia 12 de maio daquele ano, a hashtag #DumbledorePresidente ficou entre as mais comentadas do Twitter.
O motivo era simples. Para os internautas, se Dumbledore conseguiu dirigir a Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts em meio a uma crise instaurada pelo vilão Voldemort, capaz de matar alguém com um movimento de varinha, certamente conseguiria tirar o Brasil da crise política e econômica.
Novos leitores
Vinte anos após o lançamento no Brasil, a saga ainda conquista leitores. Foi em meio à pandemia do novo coronavírus que Miguel, 9 anos, começou a ler Harry Potter e a Pedra Filosofal, o primeiro da série. “Comecei ontem, estou na página 17”, conta. Mas o bruxo já é um velho conhecido. “Conheci quando minha tia veio passar as férias no Rio de Janeiro. Eu estava no hotel com ela e o filme passou na televisão. Eu gostei.”
O personagem preferido de Miguel é o próprio Harry e ele está seguro ao dizer que se fosse convocado para estudar em Hogwarts ficaria na mesma casa que o personagem principal, Grifinória.
Miguel não é o único novo leitor. De acordo com Zolotar, as vendas dos sete livros aumentaram cerca de 40% nas últimas quatro semanas, período em que foram acirradas as medidas de isolamento social para conter o avanço do vírus. (ABr)