‘A Justiça faltou e falhou’, diz avô de menina assassinada pelo pai no Recreio

Eduardo Gomes Affonso morreu um pouco na última quinta-feira, dia em que o corpo da neta, Maria Eduarda, de 11 anos, foi encontrado. A dor pela perda da menina — morta pelo pai, Alexander da Silva, ao lado do seu irmão mais novo, Matheus, de 11 meses, e da madrasta, Andréa Cabral, de 37 anos — faz o aposentado de 80 anos repetir duas frases: “Eu queria o melhor para ela” e “Ele é um monstro”, se referindo ao pai da garota, Alexander foi preso na sexta-feira pelo crime, ocorrido no condomínio onde a família morava, no Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste do Rio.

Maria Eduarda era a única neta de Eduardo, nascida de sua única filha, Fabiola Fernandes Affonso, que morreu em fevereiro de 2013, aos 37 anos, vítima de um câncer de mama. Desde 2014, o aposentado tentava na Justiça uma decisão judicial que permitisse uma convivência maior com a garota. Em 2021, deu início a uma ação judicial para obter a guarda da menina.

Maria Eduarda: “Eu pedi tanto a Deus uma mãe, que ele me deu. Ela me ama e eu amo ela”
Maria Eduarda: “Eu pedi tanto a Deus uma mãe, que ele me deu. Ela me ama e eu amo ela” Foto: Agência O Globo

Nessa época, Alexander já era réu pela morte de uma ex-noiva, a professora Tatiana Rosa de França, de 27 anos, assassinada em julho de 2009. Alexander nunca foi a júri pelo homicídio. A demora no julgamento só aumenta a revolta de Eduardo.

— A Justiça tardou e falhou. Eu dizia para o juiz que a personalidade dele já estava revelada. Se ele estivesse preso, nada disso teria acontecido. A Justiça me deixou inconsolável — diz Eduardo, chorando. — Ele (Alexander) não matou só a minha neta, mas também os meus sentimentos.

Após a morte de Fabiola, o aposentado só conseguiu conviver com a neta por alguns meses. Alexander, conta ele, começou a criar problemas e dificultar a visitação. Eduardo só viu uma saída: procurar a Justiça.

Alexander foi agredido por moradores do condomínio antes de ser preso
Alexander foi agredido por moradores do condomínio antes de ser preso Foto: Reprodução

A resistência de Alexander em deixar que a filha visse o avô fez com que, em 2020, Eduardo Affonso conseguisse um acordo para ficar ao menos períodos dos fins de semana com a neta. A decisão foi respeitada por pouco tempo. Entre março daquele ano e este mês, o idoso só conviveu com Maria Eduarda em seis momentos, sendo quatro deles por ordem judicial.

— Ele sempre dificultou tudo. Já chegou a exigir dinheiro para eu ver a minha neta. Pedia dinheiro para tudo, com a desculpa de que ela estaria precisando de alguma coisa. Mas ele queria o dinheiro na mão, e não que eu comprasse o que ela queria. Sempre paguei escola, plano de saúde, roupas, tudo — explica.

‘Estava feliz e não queria voltar pra casa’

Segundo o idoso, a última vez que saiu com Maria Eduarda foi no dia 12 deste mês, quatro dias antes de a menina ser morta. Na ocasião, uma das poucas vezes que conseguiu ficar com a neta sem ser por intervenção da Justiça, Eduardo levou-a para brincar num shopping da Barra da Tijuca, também na Zona Oeste. No passeio, Maria Eduarda usava sua roupa favorita, um vestido amarelo estampado com margaridas. “Vestido que meu avô me deu. Eu amo ele, é meu vestido favorito”, disse a menina em um vídeo.

Bebê entre as vítimas
Bebê entre as vítimas Foto: Reprodução

— Ela estava feliz, e eu via no rosto dela que não queria voltar para casa. A gente não vai mais conseguir passar no shopping ou pisar lá, porque vamos lembrar da felicidade dela. Penso até em sair da cidade, não sei se vou conseguir conviver com isso — lamenta o aposentado.

Ricardo Vasconcelos, advogado que acompanhou a família no processo para conseguir o acordo de visitação e na tentativa de obtenção da guarda de Maria Eduarda, explica que o novo processo de guarda da menina estava em etapa pericial, e próximo do fim.

— Um assistente técnico já tinha analisado a conduta dele (Alexander). No dia em que acreditamos que ele tenha cometido o crime, ele tinha uma entrevista com a perita, mas ele disse que não poderia comparecer e que teriam que remarcar. No dia 28, a Maria Eduarda falaria com a assistência social e com uma psicóloga. Essa entrevista estava marcada para acontecer na escola dela, para ser longe do pai, mas não deu tempo — explica o advogado.

Andrea e dois filhos foram mortos
Andrea e dois filhos foram mortos Foto: Reprodução

Segundo ele, a esperança era que Eduardo conseguisse a guarda total da menina, e que o pai pudesse, inicialmente, visitar a menina apenas com supervisão. Em caso de ser julgado culpado no processo por homicídio em 2009, responderia pelo crime e não teria, então, mais contato com a menina. Para o avô de Maria Eduarda, seu objetivo de vida era “libertar” a neta:

— Era o objetivo maior que eu tinha na minha vida, resgatar a memória da minha filha, dando proteção plena a minha neta, para ela triunfar — afirma Eduardo, que conta também o quão dócil e inteligente era a menina: — Ela era um exemplo para o colégio, já ganhou olimpíadas de matemática da escola. Sempre conviveu docilmente com todos, tanto no prédio, quanto no colégio.

Questionado, o Tribunal de Justiça do Rio não se manifestou sobre a demora no julgamento de Alexander da Silva pelo homicídio de sua ex-noiva.

Fonte: Fonte: Jornal Extra